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sexta-feira, 29 de abril de 2011

O casamento dos ingleses

     Mel está no cio. Sério, a terneira precisa urgente de um touro apaixonado. É que o Pirata é castrado, e o Gerineldo ainda é muito novo. Entrei em contato com um vizinho e ele me cobrou R$ 70,00 para levar um reprodutor até o sítio. Achei caríssimo. Aonde já se viu, cobrar uma exorbitância dessas para saciar os desejos da vaquinha. E é coisa rápida, pois os animais, diferentemente dos humanos, não se preocupam muito com a festança que o sexo proporciona. O macho vai lá, cobre a fêmea e se manda. Ela só vai pensar nele depois de mais de um ano. Caso contrário, o sítio seria um cabaré de cego dentro de um balaio de gato. Liguei para um veterinário fazer uma inseminação artificial. – São cem reais –, avisou o camarada. – Mas o senhor tem que ver o dia exato em que ela entra no cio. Doze horas após, é que a inseminação pode ser feita. Nem antes, nem depois. Se não, ela não emprenha – advertiu o instruído nos negócios de animais.

     Ora, eu não moro no sítio, pensei. Como é que vou monitorar o cio de uma novilha? Descartei a segunda opção. Será que a Mel terá que esperar o Gerineldo crescer? No feriado de Páscoa, estive por lá e nada. A chifruda não deu sinal de urgências sexuais. Sabendo que o desejo da danada voltará depois de três semanas, desde que não haja cruza, fiquei preocupado com a solução para a beldade. Abri o jornal hoje cedo e deparei-me com a manchete: “União de fazer inveja”. Em seguida o periódico tricotava: “Milhões de pessoas no mundo todo acompanham o casamento de Kate e William hoje”. Na hora do almoço, uma televisão dentro do shopping se exibia com imagens do casamento dos ingleses. Um monte de desocupados se extasiava ante o aparelho. Fiquei indignado. Se bem que não é coisa das mais raras eu ficar assim. Olhei para um cidadão que aparentava ter seus cinqüenta anos e gritei-lhe em pensamento: “Vai limpar um quintal, morcegão”. Uma moça, que não tinha mais do que vinte anos, era toda devaneios, e eu dei-lhe também um grito mudo: “vai lavar uma louça, menina”. Voto vencido, debandei daquele manicômio metido a lúcido.

     Não faz nenhum sentido para mim assistir babacamente o casamento de dois estranhos. Mesmo que esses desconhecidos façam parte da nobreza britânica. Aliás, por serem ligados a corte, causam-me verdadeira repulsa. O que fizeram os ingleses por suas colônias na África e no Oriente? Quando o exército da rainha era expulso de uma colônia, deixava-a destruída. Empobrecida mais do que antes da chegada dele. Por não ser ignorante quanto a esses fatos, cuspi no casamento dos bretões. No momento, o único casamento que me chama a atenção é o da Mel. Essa, sim, merece meu apreço, mesmo que o noivo dela ainda seja indefinido. Kate, William?! Como se diz em Blumenau: “que nojo”.

quinta-feira, 28 de abril de 2011

O jogador que beijou muito

     Não, não sou saudosista. Não superestimo o passado. Não digo que os tempos idos foram melhores do que os atuais. Seria imprudente falar assim. Não recordo apaixonadamente o fato de ter direito a um par de sapatos por ano. E era assim na minha infância. Mas como esquecer o primeiro kichute que ganhei? No início dos anos 1970, esse calçado fez sucesso no Brasil. Era um misto de tênis e chuteira. E a meninada adorava. Imagine só: a gurizada, ao mesmo tempo em que ia estudar, estava prontinha para uma partida de futebol. E isso, depois da conquista do tricampeonato de futebol pela Seleção Brasileira no México, foi como mel na chupeta. A Alpargatas, fabricante da marca, chegou a vender 9.000.000 de pares em determinado ano. O pirralho que não tivesse um, não era gente. Quando fui presenteado com um, foi a glória. É legal lembrar-se disso, mas é um tempo que se foi. E o prazer de ganhar um kichute não supera, nunca, a dificuldade pela qual passávamos. Hoje, tudo é mais fácil. As diversas marcas de tênis desfilam nos pés da macacada como se fossem chuchu na serra. O passado uso como lição, como aprendizado, como escola. Por isso não sou saudosista. Até prefiro os dias atuais. É, mas tem umas coisas da chamada modernidade que não entram na minha cachola.

     O futebol, por exemplo. Já contei, em outras crônicas, que o rádio de pilhas fez meu imaginário ganhar ares de Spielberg. Com o passar do tempo e o advento da televisão, as partidas futebolísticas tornaram-se produto comercial. E nada mais que isso. E como tudo que envolve dinheiro merece, no mínimo, ser questionado, desiludi-me com o esporte bretão. Continuo gostando do danado, mas não acredito nem um pouco em sua lisura. Até que é aceitável o fato da modalidade ter virado comércio, pois o mundo é puro comércio. O nascimento é um comércio, viver um comércio, o casamento é um comércio, e até a morte – por incrível que pareça – é puro comércio. Tem coisas, entretanto que passam dos limites.

     Ontem, assisti 15 minutos do jogo entre Real Madri e Barcelona. O futebol jogado pelas duas equipes era infinitamente pior do que o das peladas que participo na AABB de Floripa. O problema é que, além do péssimo futebol, o telespectador ainda tem que ouvir asneiras de pseudos-jornalistas. Em determinado momento, ao se referir a um atleta do Barcelona, o narrador esbaldou-se: “Ele beijou muito na boca nesse final de semana”. O ignorante profissional nem ao menos sabe a sutil diferença entre fim e final. E é fácil: só tem final quem tem inicial; quem tem início tem fim, não final. Assim sendo o tal jogador, caso tenha beijado muito, o fez no fim de semana, nunca no final. Língua portuguesa à parte, mas continuando em matéria de língua, o que eu tenho a ver com os beijos de um peladeiro? Será que o tal narrador pensa que disse alguma coisa importante e que tenha a ver com o futebol? Ou o cara é viciado em novela, apesar dele não ser da Globo? Aí não tem jeito, paisano, “que saudade do meu rádio de pilhas”.


quarta-feira, 27 de abril de 2011

Divina indignação

     Outra vez, Jipão agrediu Bibigul. Covardemente, diga-se de passagem. O leitor contumaz desse blog sabe que Jipão é o nome de uma terneira Jersey, e Bibigul é uma bezerrinha mestiça de Holandesa, bem mais nova do que a agressora. A holandesinha leva esse nome porque é glutona, como é a personagem homônima na obra O Livreiro de Cabul. Jipão não tolera a presença de Bibigul. Na hora da ração, nem se fala. É preciso que o tratador, no caso eu, fique entre as duas. Caso contrário, Bibigul terá que se contentar com o pasto, enquanto Jipão se refestela no trato especial. É uma violência imbecil, como toda violência. E covarde, como já disse na segunda frase deste parágrafo. Digo isso porque todo ato violento parte de um agente mais forte para uma vítima mais fraca – isso é uma tremenda deslealdade. A destruição da cultura indígena, por exemplo, é um típico caso de covardia perpetrada por brancos metidos a filhos de Deus. Tanto no Brasil, como nos Estados Unidos, os conquistadores europeus chegaram municiados de bíblias, sacerdotes e armas de fogo. O índio não tinha outro recurso: ou aceitava a escravidão, entregava suas terras e se convertia a nova religião, ou era assassinado. O mesmo ocorreu com os negros, com os judeus na campanha nazista e com as minorias em todo o mundo. A violência é um ato covarde. E insano, também.

     Daqui a alguns meses, Bibigul terá o dobro do tamanho da Jipão. Sim, a raça Holandesa é de grande porte, já a Jersey é nanica. Em breve, se as coisas continuarem nessa batida, a guerra vai ser inevitável. A guerra, meu chapa, é fruto da violência. A violência é insana, e a guerra é a insanidade materializada em toda sua plenitude. Um sujeito vê-se de frente a outro que nunca viu, não sabe o nome, onde mora, ou quem são seus familiares. Mesmo assim, puxa o gatilho e estoura-lhe os miolos. É insano. Agora, imagine uma guerra em que um lado dos combatentes tem mísseis enquanto o outro só dispõe de pedras. É muita covardia. Tudo isso para que? Para ser o dominador. Para ter o direito de mandar prender, soltar ou matar quem bem entenda. Aos de pedras na mão, resta tentar sobreviver, trocar os seixos por metralhadoras e contra-atacar. Como Bibigul está fazendo.
 
     E quando a covardia acontece pertinho de nós, dentro das empresas em que trabalhamos, nas salas de aulas em que estudamos ou no condomínio em que vivemos? Não fiquemos “sentados no trono de um apartamento com a boca escancarada e cheia de dentes esperando a morte chegar,”como cantou Raul Seixas. Você ainda tem a capacidade divina de se indignar. E essa indignação, paisano, é a chave de qualquer mudança.

terça-feira, 26 de abril de 2011

O traficante de escravos e o senador Roberto Requião

      A propósito, paisano: você sabe quem financiou a corte portuguesa quando ela se instalou no Rio de Janeiro, lá pelos idos de 1808? Dom João e sua turma eram uma cambada de perdulários. Quebraram Portugal, deram no pé quando as tropas napoleônicas comandadas pelo fraquíssimo Junot se aproximaram, e navegaram rumo à liberdade da colônia tupiniquim. O Rio, que por incrível que pareça nunca teve um rio singrando suas terras, era um tremendo lixo. Esgotos a céu aberto, mercado infestado de todo e qualquer tipo de insetos, e muita, muita ignorância. Sim, meu caro, os livros e jornais eram proibidos de circularem entre os analfabetos do futuro Reino dos Políticos Desavergonhados. O lençol freático carioca era bem próximo da superfície e, por isso, não se construiam fossas sépticas na cidade. Todas as manhãs, um exército de negros escravos carregava barris de excrementos para jogar na praia. O barril nao era vedado e consequentemente vazava amônia e ureia nas costas dos carregadores. O fétido líquido recolhido dos penicos dos brancos deixava marcas nas costas dos africanos e eles eram apelidados de Tigres. E daí?, você pode estar me perguntando.

     Daí que nao terminei, camarada. As casas do Rio, apesar de parecerem bonitinhas para quem atracava na Baía da Guanabara, revelavam-se ordinárias para quem ousava entrar nelas. Onde Dom Jõao, o primeiro monarca europeu a por os pezinhos chulezentos no Novo Continente, iria morar? É aí que surgem os primeiros donos do Brasil. Digo primeiro donos porque essa categoria de nobres senhores se enrraizaria pelo nosso território e espalharia seu tentáculos pelas próximas gerações. Até hoje, seus herdeiros legítimos mandam e desmandam nas terras verde e amarelas. O pançudo Dom João foi morar no Palácio de São Cristóvão. A construção de três andares foi dada como presente por um grande traficante de escravos. Ora, ora, amizade, o tráfico de escravos foi uma das coisas mais repugnantes cometidas pelo ser humano em toda sua história. Calcula-se que, entre os séculos XVIII e XIX, 2.000.000 (dois milhões) de escravos foram arrastados dos seus mundos para o Brasil. Somando-se os que morreram na travessia do atlântico, cujo sofrimento é bem retratado por Castro Alves em “O navio Negreiro” e “Vozes D`África”, o número torna-se um despautério. Você sentiu um nó na garganta quando assistiu algum filme sobre a matança dos judeus pelos nazistas? Então, parceiro, imagine o que sofreram os miseráveis e desalmados africanos. Pois então, os responsáveis diretos pelo tráfico de escravos foram os principais financiadores da Corte de Dom João.

     Os tais traficantes, perpetradores da barbárie, tinham passe livre na corte. Eram os senhores mais respeitados da nação. Ai de quem ousasse ofender um desses traficantes. E o que mudou nesses quinhentos e onze anos de pós-descobrimento? Ontem, um repórter da Rádio Bandeirantes perguntou ao senador (com s bem minúsculo) Roberto Requião (PMDB-PR) se ele abriria mão da pensão de ex-governador. Irritado, o político arrancou o gravador da mão do profissional de imprensa e se mandou. Depois, apagou o conteúdo do aparelho e mandou um servo devolvê-lo ao rapaz. Insatisfeito com o crime praticado, e certo da sua impunidade, o caudilho paranaense publicou na internet: “Acabo de ficar com o gravador de um provocador engraçadinho. Numa boa, vou deletá-lo”. O coitado do jornalista tentou registrar queixa na Polícia do Senado, mas o pedido não foi aceito. Os policiais recusaram registrar a ocorrência. Insistente, o repórter foi à Corregedoria da Câmara para encaminhar uma reclamação. Hahaha. O Senado não tem corregedor desde a morte de Romeu Tuma.

     Dom João, danado, que semente ruim você plantou nessa terrinha, hem?






segunda-feira, 25 de abril de 2011

Na páscoa, rolou farelo

     Farelo. Exatamente, farelo. Foi o que rolou nessa páscoa. Nada de ovos de chocolate, coelho, ou álcool. Se bem que, álcool até que teve: duas taças de vinho com queijo e salame de Blumenau. Dividindo por quatro, deu meia taça por dia. Chocolate, nem pensar. Sendo fã de Jesus Cristo, aquele cara que ousou desafiar os religiosos da época lá pelas bandas de Israel, eu não iria me perdoar depois que profanasse a páscoa me empanturrando com ovos de chocolate. O coelho, por sua vez, nem ousou passar perto de mim. O nobre leitor deve saber que páscoa não tem nada a ver com chocolate; e muito menos com coelho. E com ovo? Fala sério, Zé Maria. A páscoa nada mais é do que a celebração da saída dos judeus do cativeiro egípcio. E era comemorada com pães sem fermento e ervas amargas. Essa história é contada no livro de êxodo, o segundo livro da bíblia. E aonde entra o coelho e o chocolate?
     Ora, ora, simpatia. É tudo conversa para boi dormir. Não tenho nada contra o feriado, pelo contrário. Principalmente como o último, que rendeu quatro dias de tranqüilidade no sítio. Mas que isso tem a ver com páscoa, ah, não tem não. Alguns religiosos, muito depois de Cristo, inventaram esse papo de coelho e ovo. Estes estão diretamente ligados aos cultos pagãos. Acho que foi uma jogada dos “donos do céu” para arrebanhar mais gente para suas hordas. Até proponho que, no Brasil, o atual símbolo da páscoa seja trocado por uma garrafa de cachaça. Não que eu beba, mas porque o álcool é adorado nos dias da folia pascal. E o farelo?

     Sim, o farelo. Já que eu estava no sítio, distribuí farelo a torto e a direito para os quadrúpedes do lugar. Isto sim é páscoa, devem ter imaginado os bovinos.

quarta-feira, 20 de abril de 2011

Que dia de índio que nada!

     Para ser sincero, nem lembrei que antes de ontem, 19/04, foi o Dia do Índio. E tenho lá minhas razões para isso. Cresci ouvindo falar mal dos silvícolas, assistindo filmes onde eles apareciam como bandidos cruéis e sanguinários, anti-progressistas. Nos livros de histórias que estudei na adolescência, eram empecilhos para os portugueses desbravadores. Além do mais, eram idiotas, acreditavam que o bandeirante poderia tocar fogo nas águas e matá-los de sede. Preguiçosos, meu Deus do céu! Só queriam saber de pescar, festar e andar pelados. Ai, como eram libertinos. Foi isso, paisano que aprendi sobre os primeiros moradores das Américas. Sendo assim, parecia-me um contra-senso comemorar o dia deles. Talvez por esse motivo, nunca gravei a data.

     O tempo foi passando e a ignorância foi se achegando. Dos trinta em diante, então, eu já não sabia de quase nada. Nem da vida, nem do mundo e nem de mim mesmo. Imagina de índio! As certezas de adolescente abriram alas para a dúvida, a dúvida que amadurece, que é insaciável, que é descrente, que procura ver além da cortina. Seguindo a dica de Cristo – “Conhecereis a verdade e a verdade vos libertará” -, debrucei-me sobre livros. Livros consagrados pela crítica, odiados pelos dominadores de plantão, baluartes da transparência. Baluartes, tão somente, já seria suficiente. Você pode está me perguntando: “E os livros de histórias do colégio?”. Simpatia, ainda hoje, lavo minha consciência para expurga-me das bestialidades contidas ali. Na busca pela verdade, viajei no tempo pelas letras de gente séria e encontrei fortes índios morando em aldeias saudáveis. De repente, portugueses desceram de embarcações e em nome de um reino tomaram posse do lugar. Religiosos pomposamente vestidos deram a chancela que os brancos precisavam. Pronto, reino e religião eram do que aqueles nativos careciam.

     Como cantaria, séculos depois, o Ultraje a Rigor, “não adianta nem nos desprezar, se a gente acostumar a gente vai ficar”. Os da selva, quando se viram enganados pelos europeus, odiaram-nos e desprezaram-nos. Não adiantou, os portugas se acostumaram e ficaram. O índio foi escravizado. Suas terras foram tomadas, seus filhos assassinados sob as bênçãos de um novo, e mais forte, deus. Suas vergonhas – conforme a carta de Pero Vaz de Caminha - foram cobertas, e eles foram envergonhados para sempre. Até o início dos século XX, eram assassinados covardemente por bugreiros – caçadores de bugres – que tinham carta branca para atirar em qualquer selvagem que vissem pela frente. Empurrados para o interior do país, foram sendo exterminados por balas, doenças e vícios trazidos pelos “civilizados” da Europa. Hoje em dia, vivem de favor em pequenas aldeias. Hipócritas como somos, temos a cara de pau de dar-lhes um dia. Nesse dia, as reportagens nos jornais – escritos, falados e televisivos – homenageiam os índios como se eles fossem animais domesticados que servem de espetáculo. O dia do índio, antes da chegada das caravelas de Cabral, era todo dia. Agora, o dia do índio já era, é apenas mais uma data comemorativa.  

terça-feira, 19 de abril de 2011

A defesa é um direito de todos

     O Pirata tem chifre. E vai continuar tendo. Por dois motivos: o primeiro é porque as guampas embelezam a cabeça dele, deixam-no mais garboso e fotogênico; o segundo é por uma questão de segurança – ora, ora, as pontas servem para ele se defender de possíveis ataques que um adversário lhe faça. Outro dia, me disseram para cerrar as pontas dos cornos do bicho. Eu quase que respondi para a pessoa: “Cerra as tuas, animal”. Meu amigo, o chifre é da natureza dos bovinos. Algumas raças apresentam variedades mochas - Hereford, Shorthorn e a Holstein Frisian, por exemplo. Não têm chifres, mas isso não fui eu quem determinou. Sou terminantemente contra a ideia, ri-di-cu-li-cís-si-ma (permita-me o neologismo, mas o momento exige), de se implantar chifre numa bezerrinha que nasceu sem eles. Por outro lado, se um malvado vier outra vez com o projeto de querer desarmar meus bichinhos, eu sou capaz de mandar ele para aquele lugar. Eu não posso, paisano, tirar dos quadrúpedes o direito que eles têm de se defender. Você tem?

     Imagine uma onça atacando um rebanho. Ela certamente buscará o mais fraco entre os animais. Os menores, os doentes e os incapazes de reagir. E porque ela faz isso? Será porque a carne deles é melhor? Não, simpatia. Ela gostaria mesmo era de saborear a picanha do touro mais forte do lugar. Para isso, teria que enfrentar as poderosas lancetas da cabeça do bicho. Uma chifrada certeira mata a felina. Por isso ela não arrisca. O cachorro é outro bicho folgado. Adora latir atrás das vacas. Quando, entretanto, a chifruda aponta-lhe as guampas, ele foge, porque não é bobo. Agora, jacaré, imagine todos os bovinos sem chifres. Uma onça olharia para um curral e só veria vítimas indefesas. Um cachorro, por mais vira-lata que fosse, teria sua missão de perturbar bem facilitada. E eu com isso?, você pode estar se perguntando.

     Gente boa, assim como os bois têm direito a defesa eu também tenho. Pense nisso antes de falar em campanha de desarmamento. Como dizia a personagem da série de TV: “Quem poderá me defender?”. Você sabe qual a quantidade de armas ilegais que entram no Brasil todos os dias? Você acha que o bandido, o marginal vai entregar essas armas para nossa gloriosa polícia? Você acha que o Estado está aparelhado para combater a violência? Se você estiver em sua casa de praia, de campo ou num passeio com amigos, e aparecer uma quadrilha, quanto tempo a polícia levará para chegar até você? E não tenha dúvida, simpatia, se os ladrões tiverem certeza que você está desarmado, já era. Tenho amigos na polícia. Eles mesmos, quando estão distante das cidades, não desgrudam de suas armas. Não que eu seja a favor do uso de armas para exibição. Penso, no entanto, que o homem de bem só deveria entregar sua arma depois que o último marginal estivesse desarmado. Porque motivo um boi teria mais direito do que eu?

segunda-feira, 18 de abril de 2011

O motorista e a vaca

     Derrubaram a Bibigul. Não sei quem foi que fez essa maldade, embora tenha ideia. O leitor contumaz desse blog sabe que Bibigul é uma terneira holandesa que tenho no sítio. Em outras partes do Brasil, ela seria apenas uma bezerrinha. Mas, no interior de Santa Catarina, bezerra é terneira. No Rio Grande do Sul também. O fato é que quando fugi da cidade, sexta à noite, e fui me refugiar entre civilizados, notei que a coitadinha estava com um lado todo sujo de terra. O que não me agrada nem um pouco é que os bichos estão muito parecidos com os humanos. Tudo bem, tudo bem, os quadrúpedes não se matam e nem se engalfinham por razões banais. Mesmo assim, têm, de vez em quando atitudes que lembram, e muito, os filhos de Caim.

     Subi a Serra de moto pela BR-282. A estrada está em obras. Estão colocando aquelas finíssimas camadas asfálticas que resistirão até as próximas chuvas. Nos lugares onde não foi feita a sinalização de solo, é terrível para um motoqueiro pilotar depois que escurece. Nas curvas à esquerda, quando os faróis dos veículos que vêm na pista contrária quase cegam o motociclista, o jeito é diminuir a velocidade. Não dá para ver nada. Aí um motorista desmiolado colava o possante dele na traseira da moto. Ou o camarada não sabe dirigir ou quer mesmo me derrubar, pensava eu sob o capacete. O pior é que se o motoqueiro cai e morre, um jornaleco sensacionalista – quase todos os jornais brasileiros se incluem nessa categoria – vai manchetar: “Mais um motoqueiro morre nas estradas”. Como se a culpa fosse sempre de quem está na moto. Livrei-me dos potenciais assassinos e, por volta das 21h estava com a bicharada.

     Passada a porteira da propriedade rural, notei, ao direcionar o farol da moto, que a subida até a casa estava interrompida. Pares de olhos tão profundos, como diz o poeta Zé Ramalho,me fitavam. Passei com cuidado por entre eles. Pirata, com seus chifres cada vez maiores, não se deu ao trabalho de tirar os 500 quilos do caminho. Tive que desviar. Aproveite e parei a moto para conversar com eles ao som das águas cristalinas do riacho. Àquelas alturas, minha vista já se acostumara à claridade da lua. Foi aí que percebi o lado esquerdo de Bibigul. Era uma lama só. Não quero julgar ninguém, entretanto já vi Jipão agredindo a órfã outras vezes. Bibigul me acompanhou até a casa e chupou uma laranja. Sério, ela chupa laranja, sim. Aproveitei para ver se estava tudo bem com ela. Estava. Foi só um susto. Jipão, danada, acho que estás indo à cidade, às escondidas, e aprendendo más maneiras.

sábado, 16 de abril de 2011

Apagão no campo

Águas Mornas, na Grande Florianópolis, sofre com falta de energia elétrica. Zona rural é a mais prejudicada. O que fazer?     


Entrada de Santa Isabel / Gilead Maurício
      Quem passa pela estradinha de terra que corta a comunidade de Santa Isabel, na Zona Rural do município de Águas Mornas, não tem como deixar de notar a presença de um homem na janela de um galpão. Sentado em uma cadeira de rodas, ele faz artesanato em madeira enquanto se distrai contemplando a paisagem digna de cartão postal. Trata-se de Raimar Luiz Scheitt, 64 anos. Cadeirante há 23, encontrou na arte o prazer de trabalhar. Ultimamente, a alegria contagiante do sexagenário está sendo posta a prova pelas constantes interrupções de energia elétrica. Com o carregado sotaque alemão, idioma falado por quase todos os moradores do lugarejo, ele reclama: “Tem faltado energia quase todo dia. O serviço para,ninguém pode fazer nada.” Cerrando algumas tábuas, mais ao fundo do estabelecimento, está Alberto Cunha, 30 anos, genro do idoso. Betinho, como é conhecido o marceneiro, não esconde a insatisfação e esbraveja: “Eu vou entrar com um processo em cima deles. Instalei-me aqui devido a promessa da Cerej de colocar energia trifásica. Já faz três anos”. A Cerej, a quem o moço se refere, é uma cooperativa de distribuição de energia responsável pela eletrificação de áreas rurais da Grande Florianópolis. Fundada na década de 1970, atende 15 municípios atualmente. Perguntei quem assumiu o compromisso e ele foi firme: “Quem prometeu foi o senhor Edson Flores da Cunha, presidente da Cerej”. Irritado, completou: “Compramos máquinas e tivemos que vendê-las porque a energia é fraca. Agora estamos perdendo horas de trabalho devido à falta de energia. No fim do mês, somando as interrupções, perdemos uns dois dias de trabalho”. Sogro e genro formam uma parceria que vem dando certo: Alberto trabalha na fabricação de móveis, operando máquinas maiores, e o sogro dedica-se a arte aproveitando, principalmente, sobras de madeira. Sem saber ao certo quem culpar, dá a última bordoada: “A comunidade está envergonhada com a Cerej e com os responsáveis municipais que deveriam cobrar um melhor serviço”.
 


sexta-feira, 15 de abril de 2011

Você tem razão

     O idoso reverendo está na sala dele conversando com um discípulo mais novo. Eis que entra um homem, que vamos chamar de Barnabé, e reclama de um colega. O ancião escuta a tudo com paciência e balbucia num misto de resposta e pergunta:

- Sabe que você tem razão!?

     Mal o reclamão sai, entra o, digamos assim, reclamado. Também insatisfeito, Aristeu se diz vítima de Barnabé e chora suas pitangas. Pensativo, de ouvidos a posto e boca fechada para nao atrapalhar a mente, o ancião dá seu parecer, fruto de anos refletindo sobre a vida.

- Sabe que você tem razão!?

     Quando o chorão sai, é a vez de o discípulo entrar em cena. Após ouvir as ladainhas das duas partes e o posicionamento do reverendo, reclama:

- Mestre, Barnabé entrou aqui e reclamou de Aristeu. O senhor deu razão a ele. Depois Aristeu entrou, reclamou de Barnabé e o senhor também deu razão a ele. Quem dos dois tem razão? O senhor não poderia ter dado razão aos dois. Teria que ter apoiado só um deles. A resposta do Ancião veio na forma de um cicio:

- Sabe que você tem razão!?

     Meu caro, conheci o reverendo da história acima. Já faleceu há duas décadas. Mas deixou marcas de sabedoria que o tempo nunca irá apagar. Jamais esqueci essa que acabei de contar. Quando a ouvi, eu era um adolescente. E como todo adolescente, discordei do ancião, pois a sabedoria, naquela época, era minha companheira diária. Hoje, menos sábio e com mais idade, reverbero as palavras que um dia foram sem sentido para mim. Bom fim de semana.

quinta-feira, 14 de abril de 2011

O imparcial, o democrata e o fingido

     Você já percebeu, paisano, como estamos cada dia mais fingidos? Acho que é por causa do tal do politicamente correto. Ninguém fala mais o que realmente está pensando. É todo mundo desconfiando de tudo e de todos. Lembre, por favor, qual foi a resposta que você deu a quem te perguntou se estava tudo bem. De repente, estavas com um baita problema, irritado e doido para dizer umas “loucuras”. Ao invés disso, vossa senhoria deu um sorriso amarelo antes de falar: “Tudo bem”. E já viu, camarada, como todo nós falamos em transparência? “A nossa empresa trabalha com muita transparência”, enchemos o peito. Nos bastidores, entretanto, fazemos de tudo para esconder nossas práticas. Outra coisa que adoramos vomitar: “Eu sou imparcial”. Fala sério, maluco. Ou você acha mesmo que é? Só não vou dizer que nem Deus é imparcial para não ser trucidado por quem não tem conhecimento em divindade. A imparcialidade e a parcialidade passam por julgamentos internos, coisa que está muito além da nossa vontade. Isso é fruto de informações que coletamos ao longo da nossa vida. Na hora de nos posicionarmos sobre determinado assunto, o cérebro checa nossos gostos e preferências. Em seguida tomamos essa ou aquela decisão. Como, assim sendo, ser imparcial? E fingimos. Fingimos e, muitas vezes, acreditamos que não estamos fingindo, o que é pior.

     Outro dia, fui a uma reunião de despedida de um cara que não vou dizer quem é. Ele tinha alguns opositores ferrenhos. No meio do blá-blá-blá, um dos que mais estavam feliz com a saída do moço levantou-se e fez a seguinte declaração: “Agradecemos muito, Fulano, pelo trabalho que você fez”. E prosseguiu com uma ladainha que me deu nojo. Fiquei tão irritado que me retirei do local. É por isso, e por outras coisas também, que Jesus Cristo nos orientou a agirmos como crianças. Duvido que um pirralho fique fazendo cena numa hora dessas. O fato é que estamos cada dia mais adultos, ouvimos menos as crianças e nos distanciamos mais dos preceitos divinos. As religiões crescem, a sensibilidade com o sagrado diminui. Na verdade, a religião institucionalizada, por si só, é anti-divina. Ela manieta, amordaça e castra o ser humano. E finge que é boa. E até acredita que o é. E as pessoas que se dizem democratas? Já viu como agem?

     O cara diz detestar os ditadores, mas quando está em posição de comando e um subordinado o contraria... “Você está demitido”. É mole?

quarta-feira, 13 de abril de 2011

Um busto às cusparadas

     Que um mau repórter merece uma boa lição, ah, isso merece. E quem pode dar a tal lição, senão o público? Isso mesmo, basta você, xará, não ler, não ouvir e nem assistir a idiotização do jornalismo. Sem audiência não há repórter que resista. Vale salientar que eu chamo de repórter aquele indivíduo que fez uma faculdade, que investiu horas em estudo e que se preparou para o mercado de trabalho. Não vale comentarista de futebol e outras coisas do gênero que não sabem conjugar o verbo ser. Mas não é assim que pensam os donos dos veículos de comunicação. Depois que o STF cassou a obrigatoriedade do diploma para o exercício da profissão de jornalista, a mão de obra no setor ficou mais barata e menos qualificada. Daí a cuspir na cara de um profissional de imprensa, por pior que ele seja, não cabe a um entrevistado.

     E foi o que ocorreu com um rapaz da televisão. Quando foi perguntar bobagem a uma celebridade – sim, ator da Globo é celebridade – levou uma cusparada. Pense, amizade, numa combinação horrorosa: repórter que se acha celebridade e ator que tem certeza que é uma. Quem leva a pior, quem? E o que pode acontecer? Nada. Levou a cusparada? O remédio é procurar a torneira mais próxima e lavar o rosto para ficar experto. Um ator de televisão, principalmente de novela, é um semideus no Olimpo das telinhas brasileiras. Sendo assim, pode fazer o que bem quer e com quem bem entenda. No Brasil, a televisão venceu a disputa contra os livros antes mesmo de o primeiro aparelho de TV ser construído. Lembra da vinda da família real portuguesa para cá? Pois então, os livros da Real Biblioteca de Portugal não vieram. Ficaram no cais do porto esperando uma chance. A preferência nos navios foi dada aos cortesãos. Os livros até que vieram, mas demorou. Quando a televisão surgiu, adeus livros.

     Conheço autor que tem mais de uma dezena de livros publicados. Quando ele caminha nas ruas das cidades, passa despercebido. Aí vem um fedelho que não soma nada de bom para a sociedade e por onde passa tem um ignorante se curvando para homenageá-lo. Ei, assim não dá. Um povo que não valoriza o conhecimento tem que erguer bustos para honrar as lhamas da televisão. Sabe as lamas?, aquele animal que adora cuspir? Então! Podemos, inclusive, criar o dia nacional da cusparada. Nesse dia, a população fará caminhadas pelas ruas das metrópoles enquanto os atores e atrizes farão sobrevôos cuspindo a tudo e a todos. Já imaginaram, meu caros, o momento de glória para os amantes das novelas? “Ah, menina, sabe quem me deu uma cuspida bem no olho? Gianechini.”


terça-feira, 12 de abril de 2011

Novos políticos, velhas práticas

     As Câmaras de vereadores das cidades catarinenses não estão para brincadeira. E, ressalte-se, o fenômeno ocorre em todo o país. Os caras estão aumentando, e muito, o número de políticos nas cooperativas. O que?, cooperativas?, como assim? Você pode estar perguntando. Paisano, o que achas que é uma Câmara de vereadores? Vamos combinar: com a quantidade de órgãos da administração pública – que não é pouco – o número de políticos “representando” o povo é um exagero. Bastava três ou quatro, desde que comprometidos. Ao invés disso, montaram verdadeiras cooperativas que atendem, antes de qualquer outra coisa, o interesse particular deles.Mas essa mamata não é coisa nova, não. Começou quando a corte portuguesa veio para cá fugindo das tropas de Napoleão.


     Junto com a família real, entre 10.000 e 15.000 portugueses atravessaram o Atlântico. Quer um dado para fazer a comparação? Quando a sede do governo dos Estados Unidos foi mudada da Filadélfia para Washington, em 1800, apenas 1.000 funcionários transferiram-se para lá. Quando o cônsul inglês James Henderson visitou nossa terrinha e viu aquela festa com o erário, ficou espantado e escreveu: “Poucas cortes européias tem tantas pessoas ligadas a ela quanto a brasileira, incluindo fidalgos, eclesiásticos e oficiais”. A bagunça era tanta que um padre recebia o equivalente a R$ 14.000 só para confessar a rainha. Ou seja, a politicalha é uma teta antiga e cheia.

segunda-feira, 11 de abril de 2011

sexta-feira, 8 de abril de 2011

Velho safado

     - Velho safado, joga bola três vezes por semana e agora vem para a fila de idosos. – Murmurou um cliente na fila da agência bancária.

     O sexagenário, visivelmente contrariado, girou a cabeça em movimento de 180 graus tentando identificar quem fez o desdenhoso comentário. Foi quando o “agressor”, de cabeça baixa, simulando não ter nada a ver com o acontecido, ergueu a fronte. Ambos riram. Eram amigos de longa data. E batem a bolinha deles na AABB de Florianópolis. Ainda vermelho devido ao desconforto criado pela pretensa hostilidade, o aposentado defendeu-se:

     - Tenho direto, né, amigo. E se tenho, uso-o.

     Verdade. Direito todos nós temos. E reconhecemo-lo a quilômetros. O que quase não conseguimos enxergar é o dever. Direito, vemos até quando não é nosso. Dever, ainda que nosso seja, acreditamos que tem outro dono. Pois é.

quinta-feira, 7 de abril de 2011

Diária de um jornalista: R$ 65,00

     Hoje, sete de abril, é dia de que? Não sabe? Que coisa feia! Na verdade, não é tão feio assim; fiquei sabendo há pouco. É dia do jornalista, meu caro. Eu, particularmente, não sou chegado a essa coisa de se comemorar o dia disso ou daquilo. Dias das mães, por exemplo, é uma forma de aquecer o comércio. Dia dos pais, dos namorados e por aí vai. É tudo motivo para gastar o rico dinheirinho. Mas, cá para nós, quem é que gasta alguma coisa no dia do jornalista? O comércio nem sabe que esse negócio existe. Conversei com uma pá de jornalistas hoje, e nenhum tocou nesse assunto. Acho mesmo é que nenhum, assim como eu, sabia dessa palhaçada. Ah, vamos combinar: que diferença faz a instituição da data? O comerciante, coitado, se fosse depender do sete de abril para vender alguma, coisa tava frito. Você sabe, paisano, qual o piso salarial da categoria? Não, não vou contar para que não digas que estou mentindo.

     Para teres uma ideia, a diária de um pedreiro, aqui, em Floripa, não é menos de R$ 150,00. Uma diarista cobra, em média, R$ 80,00 por faxina. Se levarmos em conta o piso salarial do jornalista catarinense, R$ 1.300,00, a diária do profissional de comunicação é de R$ 65,00. Isso mesmo, levando-se em conta vinte dias trabalhados, o valor é bem esse. Aí o maluco dá-lhe fazer hora extra. Aí a sociedade dá-lhe querer boas matérias. Aí o patrão dá-lhe querer produtividade. Aí o Supremo dá-lhe bordoada. Claro, os togados acabaram com a obrigatoriedade do diploma de jornalismo para o exercício da profissão. Qualquer pessoa, com o mínimo, eu disse o mínimo, conhecimento da língua portuguesa, pode escrever em um jornal. Lógico, é só o veículo ter um ou dois editores mais ou menos que a festa está feita.

     Aí um louco me mandou um email dizendo: “parabéns pelo seu dia”. Vai te danar, Zé Mané, quem foi que te disse que hoje é meu dia? Meu dia foi ontem, é hoje e será amanhã.

terça-feira, 5 de abril de 2011

Arnaldo Jabor, irônico ou cínico?

     Fiquei tempos com Pornopolítica esticado na minha estante. Confesso que comprei o livro por impulso. Não gostei do título. Muito menos da capa. E um livro, meu chapa, não basta ser bom. Tem que seduzir, ter uma boa aparência e ser novo. Se não for assim, dificilmente compro. Cada vez que olhava aquela frente retratando Vênus, Sátiro e Cupido, desistia da leitura. Até que, nesse fim de semana, estava no sítio e terminei de ler uma aventura de um motociclista que saiu de São Paulo e foi até o Alasca. Ao concluir, busquei alguma coisa recém-comprada e não encontrei nadica de nadica. Restou-me a risada medonha de Sátiro.

     Mal comecei a ler, ainda na página dezessete, Arnaldo Jabor desafinou: “Vejam os bilhões de imbecis com o rabo para cima rezando todo dia para um ser que não existe”. Senti-me traído por mim mesmo. E essa, paisano, é a pior de todas as traições. É quando teu ser interior rompe com tuas ideias e te leva a cometer insensatez que jamais concordarias que fosse feita. Bem que eu não queria comprar, bem que eu não queria ler. A declaração do cineasta retratou, como se tivesse sido cunhada com essa intenção, a capa da obra. Arnaldo Jabor, meu filho, pede pra sair. É porque eu não sou, mas se eu fosse mulçumano gritaria: “Imbecil é você, Jabor. O que um burguesinho carioca como você sabe sobre o mundo islâmico? Um babaca que pegou carona em Nelson Rodrigues – é isso que você é - deveria escovar os dentes antes de falar de religiosidade. Um ateu desgraçado como você, Jabor, que adora ironizar, mas não sabe a diferença entre ironia e cinismo, deveria ler um, pelo menos um, livro sobre os mulçumanos”. Não sou mulçumano, por isso continuei o livro. Porém...

     “São recrutinhas fracos, com capacetes frouxos e cara de nordestinos analfabetos”. Espera aí, Jabor, agora você se passou. E só não te mando à PQP porque sou um cara educado. Fosse eu um desbocado diria: “Vai à &^%^)(&@, seu %$#@*&”. Só não toquei fogo naquela porcaria porque quero ter a prova do quão abjeto, infecto e purulento pode ser um homem que se acha inteligente. Dá uma de Doca Street, Jabor, e escreve um Mea Culpa. ah, não toquei fogo, também, porque sei que escrever um livro, por pior que ele seja, dá trabalho. E esse empenho não pode ser desprezado. Nem por mim, nem por mais ninguém.

segunda-feira, 4 de abril de 2011

Quem é esse cara?

     Ele é danado. Quem vê, pensa que o moço é a candura personificada. Quando falamos nele, imaginamos uma criatura frágil, dócil e simpática. Contudo, como diz a remodelada frase, “quem vê cara não vê AIDS, não”. O carinha, na verdade, é briguento, possessivo e muito forte. E aí eu pergunto: porque a gente se engana tanto? É devido a nossa ignorância, respondo. Claro, simpatia. Para não comprar gato por lebre, precisamos um mínimo de conhecimento sobre os dois fedelhos. Exemplo: o gato mia, sobe em árvores e adora deitar na cama do dono. Ah, adora banquetear-se com pássaros incautos. A Lebre, por sua vez, é muda, muda. Sabendo disso, terás grande chance de diferenciar os safadinhos.

     Colibri, cuitelinho, que nada! Ele é famoso mesmo como beija-flor. E de tão famoso, ganhou até desenhos estilizados nas famosas Linhas de Nazca. Ora, ora, com um nome desses – beija-flor – Joseph Stalin se passaria por Madre Tereza. O beijo nos traz, geralmente, lembranças de bons momentos. Nesse caso, excluamos Judas e seu beijo dedo-duro. A flor, do mesmo modo que o beijo, simboliza o amor, a pureza e tudo que há de mais delicado. Experimente juntar beijo e flor. Que perfeição. Agora, se não for pedir demais, enumere três características do beija-flor. Ha, ha, ha.

     Colocou briguento em sua lista? E dominador? O quê, não botou violento!? Então, paisano, você não conhece, desculpe-me a sinceridade, o beija-flor. Eu tenho, acredite, uma relação próxima com os camaradinhas. Eles vêm na minha mão. Tenho ideia, por isso, de como se comportam. Costumo colocar águas em bebedouros artificiais para eles encherem a pança. Tem uns que, após beberem água, ficam ao lado das falsas pétalas montando guarda. Quando um outro se aproxima, ele parte para o ataque. Olha, amizade, levando em conta o tamanho deles, a briga é feia. Quase se matam. É, meu chapa, a nossa falta de conhecimento leva-nos a conclusões precipitadíssimas sobre os outros.

     Acho que foi por isso que Jesus Cristo advertiu: “E conhecereis a verdade e a verdade vos libertará”. Agora, olhe para quem está mais perto de você e se pergunte: quem é esse cara?








sexta-feira, 1 de abril de 2011

O cliente folgado

     É verdade, embora hoje seja primeiro de abril. Um colega meu, gerente de uma agência bancária aqui na ilha, estava incomodado com a atitude de um certo dentista. O tira-dentes chegava para trabalhar e estacionava seu possante em uma vaga que o banco destina a portadores de necessidades especiais. Cometeu o crime uma vez, duas, três... Aí, incomodado com a insensatez do homem de branco, meu amigo chamou o guincho. Desculpe-me, paisano, mas o odontólogo passou das medidas. É muita folga. O gerente procurou encontrar alguma limitação física no camarada. Nada, o único problema do mala era a educação – pelo menos à primeira vista.

     Ponha-se, por favor, no lugar de um cadeirante que chega à agência e vê sua mísera vaga ocupada por um moço posudo e faceiro. Terá que procurar uma vaga – dificílima aqui em Floripa – distante e lutar contra o confuso trânsito da capital catarinense. O guincho veio. O bonitão desceu dos tamancos. E como todo sujeito errado, tratou de estufar o peito:
- Eu sou cliente deste banco. Vou tirar minha conta daqui.
    
     O gerente, que não é lá muito adepto da desordem, mirou no grão dos olhos do folgado e mandou brasa:
- Pois tire; o banco não precisa de um cliente como você.- Ai.

     Pa-ra-béns, meu amigo. Bendito seja o homem que preserva o direito do deficiente. Bendito seja o homem – e a mulher também; calma, minha senhora – que se preocupa com o direito do idoso, da criança e... enfim, de quem tem direito. Um dia desses, vou até a agência só para apertar a mão desse gerente. Se ele fosse nordestino eu diria: “Eita sujeito cabra da peste”. Só não digo o nome dele porque não estou autorizado, mas que é verdade, ah, isso é.