Utilização do conteúdo

Autorizo o uso do material aqui produzido, desde que seja dado crédito ao autor e não tenha uso comercial

terça-feira, 7 de junho de 2011

Assassinatos no campo

     Fui criticado. Injustamente, diga-se de passagem. Nove. Foi esse o número de emails que recebi de alguns leitores deste blog. Imagine, paisano, que chegaram a me chamar de jornalista ditador. E tudo porque me autonomeei interventor da República Três Platôs. Um camarada mais preocupado com a qualidade de vida dos bovinos alertou-me que está pensando em fazer uma denúncia contra mim na sociedade protetora dos animais. Segundo ele, estou interferindo na ordem da natureza. Ora, ora, como se ele não estivesse usando energia advinda de uma hidrelétrica que, para ser construída, avariou quase que um ecossistema inteiro. “Ah, jacaré, para ter direito a me criticar tens que voltar às cavernas”, respondi-lhe complementando que o modo de vida que adotamos tem alterado drasticamente o meio ambiente. Chateado, mandei que ele fosse procurar um marido, lavar uma louça ou limpar um quintal. E para deixar claro, não pretendo me demitir do cargo que ora assumo. A não ser que meu patrimônio cresça de modo incompatível com o cargo que tenho. Aí, meu chapa, não serei um cara de pau de quilate elevadíssimo para querer justificar batom na cueca. Mas por enquanto...

     Além do mais, a República precisa de mim. Desde que me tornei interventor, a vida dos quadrúpedes melhorou sensivelmente. O campo virou um lugar mais tranquilo para a bicharada. Para se fazer uma comparação, vejamos o que acontece na república brasileira. No Pará – fique de queixo caído -, 98% dos assassinatos no campo ocorridos nos últimos dez anos ficaram impunes. Esse dado é do governo federal. Não me levem a mal, amigos, mas não permitirei que uma lástima dessas aconteça na República Três Platôs. Tendo um grama de vergonha no olho já poderei evitar esse flagelo. Caso eu não o faça, podem ter certeza, aliei-me a grileiros, a fazendeiros que eliminam vidas por um hectare de mata nativa, a madeireiros que não têm limites para a ganância, a policiais e fiscais corruptos – que recebem mais dinheiro quando ficam calados -, a juízes e promotores comprados por caminhões de reais sujos de sangue. Sangue de homens pobres que se puseram contra interesses escusos. A intervenção no Três Platôs vai continuar. Tenho alguns motivos para isso.

     O primeiro deles é que não fui eleito com a ajuda de empresários avarentos. Nenhum dono de empresa deu-me um centavo para a campanha. Até porque não houve campanha. Tivesse euzinho recebido, teria que governar para satisfazer interesses de hienas que não pensam duas vezes antes de abocanhar a riqueza do campo. O segundo é que não estou vinculado a nenhum partido político. Essas instituições, que mais parecem covis, são algemas que aprisionam as convicções de qualquer homem público. Não, não deixarei que a República Três Platôs torne-se um Brasil, onde a anarquia disfarçada reina deitada eternamente em berço esplêndido. Ficarei interventor até que a ordem e a disciplina – fruto da educação – sejam uma realidade consolidada. Que me mandem email, que digam que sou ditador, que me achem cruel. Pior, muito pior, é governar um país com tantos assassinatos no campo e não fazer nada para mudar o panorama.


Nenhum comentário:

Postar um comentário