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quarta-feira, 29 de dezembro de 2010

Duas sungas e um maiô

     Passou em disparada. Não devia ter mais do que cinco anos. Descaço, sem camisa, usava apenas uma sunga verde. A boca aberta só fazia berrar. Parecia ter sido predestinado a ser tenor. Até agora, o choro do danado reverbera em meu escutador de forró. Dez segundos depois, apareceu a mãe. Na mão direita, alguns brinquedos daqueles que as crianças gostam de usar para fazer piscinas na areia da praia. Na esquerda, uma espécie de esteira, daquelas que as mulheres adoram estirar na areia para, em seguida, prostrarem-se e esquecerem-se do mundo. E só abrirem os olhos se passar outra mulher perto precisando de uma inspeção. Os olhos denunciavam sua ascendência asiática. Caminhava olhando para o chão. Não sei se para não cair ou de vergonha de não ter o mínimo controle sobre um filho tão pequeno. Quase pisando nos calcanhares da mulher, veio o pai. Aquele famoso barriga de nós todos. Assim como o guri, vestia apenas uma sunga. Em uma das mãos, uma cadeira de praia. Na outra, um isopor. Ainda ouvi ela grunhir: “Não grite, filho”. Foi um combustível nas cordas vocais do rebento.



     Fui forçado a interromper minha leitura. Do alto da varanda, onde eu estava espichado na rede lendo Milan Kundera, fiquei observando a família de veranistas. “Poxa vida”, pensei, “são quase duas horas da tarde. E nesse caso o guri deve até ter razão em chorar tanto. Deve estar com fome”. Aí escutei o homem berrar: “Você vai ter que almoçar, sim. Caso contrário, não vai à tarde para a praia”. Aí minha dúvida aumentou. Não quanto ao chororô, mas quanto à cabeça baixa da senhora. “Afinal, ela anda cabisbaixa envergonhada com o comportamento do piá ou com o jeitão do marido?”. No fim da tarde, quando fui caminhar, vi o trio na beira do mar. A mulher esparramada na esteira e o pai reclamando com o menino: “Você já chupou três picolés; não vou comprar mais”. Ao que o pimpolho respondeu: “Se não me der eu vou embora”. Preferi não assistir o desfecho da contenda. Mais tarde, quando eu já estava em casa, eles regressaram. Os dois bebês de sunga e a senhora de maiô. Ê, verão.

terça-feira, 28 de dezembro de 2010

Papai Noel maranhense

     Memórias das Minhas Putas Tristes. Esse é o livro. Há quem diga que a obra está no topo das mais lidas pelos políticos brasileiros com idade acima dos 70 anos. Não pela reflexão que o personagem nonagenário de Garcia Marquez faz sobre a vida, e sim pelas putas. Putas tristes, putas felizes ou seja lá qual for o tipo de comportamento que apresentem. Sheid, meu cachorro, que há tempos estava fora do nosso planeta, com medo do efeito estufa, elegeu o deputado Pedro Novais como legítimo representante dos anciãos dados ao baixo meretrício. O político maranhense promoveu uma orgia em um motel da capital brasileira do reggae. “Eram vários casais, várias pessoas, e nós cobramos por casal”, explicou a gerente do estabelecimento. E acrescentou: “era um dos quartos mais caros; já que tem piscina, banheira, sauna, tudo isso”. Deputado desde 1983, ex- auditor fiscal do Tesouro Nacional e advogado, o raparigueiro botou a despesa na conta da Câmara. Vacilou.



     No início do mês natalino, o Papai Noel da putaria foi indicado para assumir um ministério no governo Dilma. Aí a cueca caiu. Os inimigos políticos do piá, acostumados às “práticas republicanas” e pós-graduados em sacanagem, denunciaram, por pura inveja, o ancião da luz vermelha. Ou você, paisano, acha que só agora o delito foi descoberto? Claro que não, não é? Nossos homens públicos sabem direitinho como, quando e como roubar o erário. Na hora que resolvem ferrar um colega, é muito fácil. Tem gente dizendo que o Sr. Novaes é inocente, as putas é que são culpadas de terem seduzido o vovô maranhense. Ouvi um cidadão dizer que a festança no motel, paga com o dinheiro público, foi uma palhaçada. Aí eu sou obrigado a discordar. Por favor, senhoras e senhores, não vamos envolver Tiririca nesse mar de camisinhas.

segunda-feira, 27 de dezembro de 2010

Vamos desinfetar a Daniela

         O verão chegou ontem. Digo e provo. Pelo menos aqui, em Floripa, foi ontem que ele deu as caras. E era por volta das 17h. Como é que posso provar? Ora, ora, com meu testemunho. Acostumado que fui, desde pequeno, com as quentes águas do meu Nordeste, só tomo banho de mar em Florianópolis quando a estação do calor aparece. No último verão catarinense, que durou cerca de 20 dias, entrei na água salgada pelo menos em 15 deles. E ontem, paisano, após minha caminhada vespertina pela praia da Daniela, o calor me empurrou para a ponta do atlântico do balneário. É bem verdade que a água não tava quentinha, mas deu para o gasto. O verão chegara.



         O que não deu para o gasto foi o furdunço em que se transformou a areia do lugar. Há poucos anos – cinco é um bom parâmetro – eu costumava dar minhas corridinhas por entre as famílias que frequentavam o pedacinho do céu entre os mortais. Ontem, no primeiro dia do meu verão, mal pudemos caminhar. Em determinados momentos, tivemos que fazer fila indiana para passar por entre os guarda-sóis, barracas e barracões. Sem falar nos vendedores ambulantes, nos banhistas e nos solistas. Por “solistas” entenda aquelas pessoas que, fascinadas com o fulgor do astro-rei, espicham-se sobre toalhas, cadeiras ou coisas do gênero e põem-se a torrar. Eu, Denise – minha mulher – e meu sobrinho Thiago, tínhamos que cuidar para não atropelar as tantas bundas que dominavam a paisagem. É de admirar o quanto as senhoras não cuidam dos seus traseiros. O passante é que precisa ficar atento para não causar uma crise no patrimônio alheio.


         Uma coisa, entretanto, Fez-me mudar o humor: a quantidade de maconheiro na areia. Digo “maconheiro” porque sei que os usuários da marijuana detestam de serem chamados assim. É como o tomador de álcool; podem xingá-lo de qualquer coisa, menos de bêbado. Teve uma hora em que fui obrigado a respirar a catinga da droga. Os clientes dos traficantes aproveitam o descaso policial e fazem seus cigarros na frente de todo mundo. Você não verá, paisano, um único policial na praia. Traficantes e usuários aviltam a lei e o direito dos demais cidadãos na maior cara de pau. Vou mandar emails para as igrejas evangélicas pedindo que elas venham espantar os maledetos. Ah, sim, bastará um grupo de jovens cantando, tocando violão e falando de Cristo. Os maconheiros não suportam religião. Será a campanha “Vamos desinfetar a Daniela”.


PS: Antes que me incomodem, o "desinfetar" não se refere às pessoas, mas ao mal cheiro provocado pela fumaça.

sábado, 25 de dezembro de 2010

Fora, filho de Deus

Hoje é Natal. E com a data, vieram os presentes. Comércio em alta. O povo nas ruas. Mas acima de tudo, felicidade. Eu, por exemplo, ganhei um binóculo potentíssimo, um vinho do Porto e um violão de 12 cordas. Saí no lucro. Por mim, podemos comemorar a festa de Noel de dois em dois meses. Meu sobrinho Tiago foi quem trouxe o instrumento musical. “Achei que combinava com o sítio e comprei para o senhor”, disse-me. Ganhei, certamente, uns quilinhos a mais, depois da comilança que a festa pede. As comemorações pelo aniversário do bom velhinho estão a cada ano mais animadas. Salve o dia 25 de dezembro. O abençoado dia em que na Groelândia, na Polônia ou em outra geladeira qualquer, nasceu Papai Noel.


É bem verdade que alguns religiosos tentaram, mas não conseguiram, colocar o menino Jesus no meio dessa parada. O tempo mostrou que a data era, de fato, do colorado barbudo. Cristo é, sabidamente, carta fora do baralho. Também não tinha como ser diferente. Aquele discurso que o Jovem Galileu apregoou, de fé, amor e simplicidade, não tem nada a ver com o espírito natalino. Ora, ora, o Natal exige dinheiro, dívida e diversão. Jantares com mesas fartas, bebidas e, mais tarde, uma balada. Se der, depois um motelzinho. Fora, filho de Deus, na festa de Noel você não tem lugar.

quinta-feira, 23 de dezembro de 2010

Neymar, o homem do ano

         Já percebeu, amizade, como as pessoas gostam de frases bonitas? "É melhor só do que mal acompanhado", por exemplo, todo mundo repete, embora muitas vezes estejam rodeados de praguinhas. "Melhor é servir do que ser servido", é outra pérola que estou cansado de escutar vindo da boca de pessoas que são incapazes de dar um pão a um doido. Ontem minha mulher ganhou um livreto com essas preciosidades. Enquanto eu jantava ela ia lendo cada uma. Confúcio, Gandhi e Dostoiévsk foram citados. Sinceramente, achei uma baboseira. Discordei de quase todas, ou pelo menos remendei algumas. Dane-se o que eu acho das idiotices contidas no exemplar, o importante é que vende pra caramba. E se dá dinheiro, paisano, é sucesso. Como Neymar, jogador de futebol do Santos Futebol Clube. O rapazinho foi eleito por uma famosa revista como sendo o homem do ano. Quando vi a notícia achei um disparate. Ora, o rapaz é, sabidamente, mal-educado. O treinador do Santos que ousou repreender o mocinho foi demitido sumariamente. Porcarias de frases, porcarias de eleições.

quarta-feira, 22 de dezembro de 2010

A raposa, a sacanagem e o lobo

          Pode me chamar de grosso, pode me chamar de babaca e até de idiota, como já fizeram alguns anônimos, mas não me chame de ignorante, porque um leitor contumaz não merece tal pecha. E desde minha mais tenra idade entendi o que significava a expressão “raposa cuidando do galinheiro”. Não precisei ler A Divina Comédia, de Dante Alighieri. Muito menos A República de Platão. Pornopolítica, de Arnaldo Jabor, nem sonhava em ser publicado. A palavra sacanagem ainda era considerada um palavrão e indigna de ser pronunciada por gente de bem. Os artistas da banda baiana Leva Nóiz talvez nem fossem nascidos; nesse caso, o hit “a sacanagem é comigo, é comigo mesmo”, com suas duas notas musicais – sol menor e ré – não embalava os festeiros da boa terra. Uma coisa é certa, o governador eleito de Santa Catarina, Raimundo Colombo, já “sartava” nesse mundo de meu Deus. Só não sei se, como eu, ele conhecia a famosa frase. Explico.

          Na última segunda-feira, o eleito divulgou alguns nomes que comporão seu governo. Entre eles, um chamou-me atenção. Trata-se de Dalmo Claro de Oliveira, presidente da Federação das Unimeds de Santa Catarina desde 1999. Dalmo será o secretário de saúde do Estado natal de Guga. E eu pergunto: “Colombo, meu filho, o que é isso?”. Ora, ora, paisano, a Unimed é uma empresa. O objetivo de uma empresa é o lucro. E como ela obtém o tal lucro? Aumentando o seu quadro de associados, lógico. Pensando bem, Colombo tem razão. Dalmo poderá, com o mínimo de esforço, resolver o problema da saúde de Santa Catarina. Já imaginou, simpatia, o povo adquire plano de saúde da Unimed e desafoga os hospitais públicos. Fantástica solução, Colombo. Mesmo assim, para muitos, isso não passa de uma manifestação clara da sabedoria popular: “É a raposa cuidando do galinheiro”, advertiu um amigo meu profissional de saúde.

          Teve uma amiga minha que me perguntou: “E se o Dalmo entregar o cargo na Unimed?”. Aí eu acho que o ditado popular vai mudar para “lobo em pele de cordeiro”. É mole ou quer mais?

terça-feira, 21 de dezembro de 2010

A dor do bad boy

          Gente, o corno precisa ser respeitado. E quero, antes de mais nada, fazer uma confissão: hoje não observei o direito de um chifrudo. Eu estava pilotando minha motoca quando escutei um barulho agudo, como se fosse de um liquidificador amplificado. E eu, que ultrapassava um caminhão, mal tive tempo de olhar de lado. Veio uma moto em altíssima velocidade, meteu-se entre eu e o cargueiro e zummm. Freou mais à frente, fez novas e arriscadas ultrapassagens e sumiu. Abri o bocão e disse-lhe uns desaforos. Arrependi-me, entretanto. Lógico; fiz errado. Errado, não, erradíssimo. O cara para dirigir daquele jeito, todo imprudente, só sendo galhudo. E o coitado não estava nem aí com a segurança dele. Ele só se preocupava, não tenho dúvida, com o flagrante que queria dar. De certo ele foi avisado que a mulher estava com o Ricardão e saiu em disparada para pegá-los com a boca na botija.

         Aquele motoqueiro, paisano, tinha o direito sagrado e venerado que todo cabrão tem. O direito de esquecer o mundo e vingar o enfeite que colocaram na cabeça dele. Nesse caso não importa se ele está de moto, de carro ou de bicicleta. Vai dirigir tresloucadamente pondo em risco a vida dos demais guiadores. Precisamos, simpatia, compreender o momento do galhudo. Portanto, faço um pedido, quando você vir um bobão “costurando” no trânsito, tente entender. É a galhada cobrando o preço. E falo assim porque um policial amigo meu parou um Audi-A3 fazendo manobras perigosas e ouviu do rapaz a seguinte justificativa: “Seu guarda, o senhor não me leve a mal. Uma colega minha acabou de me ligar dizendo que minha namorada está na praia com outro. Eu quero pegar os dois, seu guarda”. O militar, sensibilizado com a dor que escorria dos olhos do bad boy, não aplicou a multa, embora tenha pedido para ele maneirar no acelerador.

segunda-feira, 20 de dezembro de 2010

Eu devia estar contente

          O telefone tocou novamente. À semelhança da canção de Jorge Bem, atendi e não era o meu amor. “Alô, é o senhor Gilead Maurício?”, perguntou a voz do outro lado. “Sim, pode falar”, fui educado. Digo fui educado porque o certo era ele se identificar primeiro e depois indagar se era, de fato, eu. Tudo bem, prossigamos com o telefonema. “Estamos ligando para confirmar o exame de rotina com doutora Fulana de Tal, conforme já havíamos agendado com o senhor”, lembrou-me a voz. “Ok, estarei lá”, tranqüilizei-a. Fui, conforme o combinado.

          Cheguei ao consultório e fui atendido por um médico que fez de tudo para que eu me sentisse confortável. “Agora vamos verificar sua pressão”, disse após alguns minutos de puerilidades. Depois verificou peso, altura e auscultou meu bombeador de sangue. “O senhor é um jovem senhor muito saudável, seu Gilead”, constatou e repassou-me à médica Fulana de Tal. Eu acabara de passar pela fase um. Nem quero falar sobre a fase dois. Até porque, foi tudo tranqüilo. A frase dita pelo primeiro médico fora suficiente para atingir meu espírito, alma e ego. “Quer dizer que eu sou um jovem senhor saudável?!”, murmurei sob o capacete, enquanto acelerava a motocicleta.

          Toda a realidade do tempo desabou sobre minha negra cabeleira. Tempo que é mais forte do que a morte. Mais duro do que o ciúme. Mais insensível do que um filho – e não importa de que filho se trate, nem de quem. Quando cheguei em casa, olhei uma foto minha aos trinta anos. Há quem diga que envelhecemos mais e pior nos retratos. “É, talvez o médico tenha razão; sou um jovem senhor”, constatou um cara até então desconhecido que olhou diretamente nos meus olhos pelo espelho do banheiro. Não era aquele mesmo que eu acabara de ver em cima de uma potente motocicleta dentro de um porta-retratos. Tava longe de ser aquele moleque que corria atrás de uma bola de meia nos anos 1970. Não, era um senhor; jovem, mas senhor.

          Eu devia estar contente, como cantou Raul seixas. Afinal, ligam-me para agendar um check-up. Afinal, estou saudável. Afinal posso pilotar minha motocicleta. Afinal, consigo jogar meu futebolzinho duas vezes por semana. Afinal posso me refestelar com páginas de autores consagrados. Mas não estou. Estou desconfiado. Ressalto que não estar contente não significa estar triste. Assim como não torcer pelo Vasco não significa ser flamenguista. Ainda bem que no dia 11 de janeiro vou a Natal passar três semanas. Verei meus pais e verei minha linda e adorável Gabriela – meu presente dado por Deus. Quem sabe se até lá o tempo não desfaz essa má impressão que me causou.

sexta-feira, 17 de dezembro de 2010

Um, dois, feijão com arroz

          Phaseolus. Esse é o cara. Ontem e hoje, só deu ele na mídia. Tá todo mundo querendo saber porque o brasileiro deixou o danadinho de lado. Chamei o rapaz de danadinho embora ele tenha diversos apelidos. Na Bahia, por exemplo, ele atende pelo singelo nome de Fradinho. Nas colônias japonesas de São Paulo é conhecido como Azuki. Nas Minas Gerais recebe a alcunha de Jalo. No Pantanal, onde o homem tem chifre na mão – o berrante, moço -, ele é carinhosamente chamado de Rosinha. No meu querido Rio Grande do Norte, desde Natal até Pau-dos-Ferros, ele é plantado, colhido e comido como sendo apenas Verde. Eu particularmente prefiro o preto.

          Já sabe de quem estou falando, não é? Isso mesmo, do Feijão. Com efe maiúsculo, sim senhor. Vamos combinar, você nunca ouviu, nem ouvirá, um brasileiro nato chegar em uma banca de feira e pedir: “Por favor, dê-me um quilo de phaseolus”. Nao. O comum é o camarada olhar para o vendedor e dizer: “Me dá um quilo de ‘fejão’ aí”. E o feijão está em alta. Por isso a imprensa tupiniquim só fala nele. Em alta e em baixa, ao mesmo tempo. Em alta porque tá nas telinhas, em baixa porque tá sendo pouco vendido. Aí vem um Zé Mané metido a jornalista e informa: “Feijão perde espaço na mesa dos brasileiros”. Como diz meu ensinador Gabriel Garcia Marquez, “notícia oficial com manchetes excessivas e parcas em detalhes”. Ouvi e li muitas justificativas sobre a queda no consumo por parte dos meus compatriotas. Teimoso feito menino chorão, não concordei com elas e resolvi publicar a minha.

          Em 2004 a Embrapa informou que os países em desenvolvimento são responsáveis por 86,7% do consumo do phaseolus. Ôpa, já é um indicativo. Nosso gigante adormecido despertou, atravessou a última crise econômica cantando “eu tava à toa na vida o meu amor me chamou pra ver a banda passar tocando coisas de amor”. Ora, ora, simpatia, quem já viu um país que quer ser chamdo de desenvolvido comer feijão!? Em compensação o consumo da cerveja aumentou. Lógico, os maiores consumidores per capta da bebida encontram-se no Velho Continente. E para parecermos com eles, resolvemos “encher a cara”. A culpa deve ser do Lula, que insistiu durante oito anos para deixarmos de ser subdesenvolvidos. Voltando ao feijão, acredito mesmo que o consumo caiu devido aos altos preços. A propósito, você tem visto alguma mãe ninar o bebê com aquela musiquinha que dizia “um dois, feijão com arroz; três, quatro, feijão no prato”? É, meu chapa, os tempos são outros.

quarta-feira, 15 de dezembro de 2010

Do Haiti para a Argélia

          Outro dia eu estava em uma fila. Não vou dizer onde e nem fazendo o quê. O fato é que tinha uma senhora na minha frente que não parava de falar. De tudo sabia. Era, pelo que percebi, mais sabida do que o ancião de noventa anos retratado por Gabriel Garcia Marquez no livro Memórias de Minhas Putas Tristes. E tava cheia da grana, percebi no blá-blá-blá. Lá pelas tantas a beldade saiu-se com esta:

- O Brasil não tem mais jeito. Vou mandar meu filhos para a Europa. Quero que eles sejam educados lá, não em um país como o nosso.

          Todos prestavam atenção. Foi aí que entrei no papo.

- E para qual país eles vão?

- Para a França. É outro mundo.

         Não sou dos mais ignorantes em história e resolvi instigar a bonitófira.

- Nesse caso seria bom que a senhora mandasse eles antes para o Haiti e depois para a Argélia. Assim ficarão sabendo quem são, de fato, os franceses.

         Ora, falei aquilo porque não suporto esse discurso ultrapassado que alguns provincianos teimam em proferir. O escritor Nelson Rodrigues chamava de complexo de vira-lata. Segundo ele trata-se de uma inferioridade em que o brasileiro se coloca diante do resto do mundo. A mulher ficou sem saber o que dizer, provavelmente por não conhecer patavinas sobre colonização. Emudecida, sacou a mixaria e sumiu.

terça-feira, 14 de dezembro de 2010

O peso dos chifres

          Ontem, no fim do dia, dei de cara com a falta de educação. Com ela estavam a grosseria, a estupidez e a arrogância. A maldita devia ter um metro e setenta de altura. Uns 55 anos. Camisa gola pólo, bermudão e sandálias de couro. Pelo jeito, era corno. E se não era, espero que se torne; ou que o tornem. Quem conhece Florianópolis, sabe que a chuva e o vento sul formam uma dupla de fazer qualquer pessoa chorar em alemão. Parei em um supermercado e o estacionamento estava lotado. Superlotado, no caso. No lado de fora, as poucas vagas encontravam-se devidamente ocupadas. Nem todas, na verdade. Tinha uma, para deficiente, livre. Um símbolo enorme, daqueles que até um cego vê, indicava que a área era exclusiva para cadeirante.

          Eu parei o carro, liguei o alerta e fiquei esperando uma brecha, coberta ou não. E a vaga para deficiente, lá.  Uma senhora estacionou o possante. Viu a pintura indicativa de exclusividade e deu ré. Outros dois veículos fizeram o mesmo. Foi aí que ela apareceu. Ela, meu Deus do céu, a falta de educação. Manobrou o símbolo de poder, desligou o motor e desceu na maior cara de pau. A cobertura poupou-lhe da chuvarada. Alertei um funcionário do estabelecimento, mas o moço esquivou-se: “Ah, meu patrão, se eu for falar ele vai me esculachar”. Perguntei-lhe se aquela atitude era comum. “Muito”, respondeu, “eu até reclamava, mas levei tanto grito que prefiro não dizer mais nada. Eles tratam a gente como se nós fosse cachorro”. Um motorista saiu e o rapaz indicou-me a vaga.

          Juro que tive vontade de entrar no mercado, pegar aquele camarada pelo colarinho e dá-lhe de sandália na bunda, como se faz com menino ruim. Depois mandá-lo embarcar na carroça e dizer: “Só saia de casa daqui a uma semana”. Quando cheguei dentro da loja, depois de quase quinze minutos, o bonitão já estava pagando as latinhas de cerveja e mais algumas porcarias. Dei uma olhada acintosa para ele esperando que me perguntasse o motivo da espiada. Eu diria que estava procurando a deficiência física dele. Ele pareceu perceber minha indignação e baixou a cabeça. Ou pode ter sido o peso das guampas.

segunda-feira, 13 de dezembro de 2010

Isso é coisa de filho

          Não sei o que houve com Aguinaldo – chamemos assim o pobre homem. Fazia um pouco mais de um ano que eu não via o cidadão. Não, ele não estava preso. Proprietário de um restaurante às margens de uma rodovia que rasga Santa Catarina, o camarada está todos os dias no front. Ressalto que ele adora o que faz; pelo menos foi o que me assegurou quando o conheci há três anos. Por essas coisas que nem Freud explica, fiquei um ano sem almoçar no estabelecimento comercial do meu amigo. Na semana passada, por volta do meio dia, vindo para Florianópolis, decidi saborear uma costela com Aguinaldo. É que sempre que vou lá, ele faz-me companhia. Senta, pergunta pela vida, conta a dele, lamenta os maus resultados do Vasco da Gama e completa: “Nunca mais vou me candidatar”. De tanto ele afirmar isso, acho que ele sai para vereador nas próximas eleições. Da última vez foi diferente.

          Aguinaldo tem cinqüenta anos, aproximadamente 1,70m, cabelo ligeiramente grisalho, bigode no mesmo tom da cabeleira e uma farta conversa. Era, pelo menos, assim. “O que aconteceu com esse homem, meu Deus”, exclamei para mim mesmo. Em um ano ele envelheceu sete, no mínimo. Sabe aquele choque que você sente quando vai ao hospital visitar um amigo que acabou de passar por um tratamento e perdeu dez quilos? Aguinaldo parecia ter jogado cal na cabeça; branca, branca. O cansaço saltava-lhe a face. Até a fala, antes tão vibrante, limitou-se a um balbucio. Nem comentou sobre o escrete cruz-maltino, que neste ano conseguiu não voltar para a Série B. Eu, que nunca tinha perguntado sobre a família do comerciante, imaginei: “Isso é coisa de filho”. Sim, porque para destruir uma pessoa daquele jeito, só um desgraçado de um filho ingrato. Vamos combinar, os tipos de filhos que são fabricados hoje em dia é uma vergonha. E um mísero herdeiro, quando ensandecido, poderia, sim, ter causado tamanho estrago no catarinense em questão.

          Coitado do Aguinaldo. Pensei em sugerir que ele voltasse à política, mas hesitei. Era melhor não incentivar. Vai que ele resolve se alegrar a custa do erário? “Aparece, Gilead”, pediu enquanto eu acionava o motor da motocicleta. “Claro, meu amigo”, respondi tentando enxergar o Aguinaldo do ano passado. Será que é problema de saúde? Ou financeiro?! Não, ele até contratara um gerente para dividir a carga. Não sei o que houve com o Aguinaldo.

quinta-feira, 9 de dezembro de 2010

Preconceito, não aceite

Para quem acha que o preconceito é coisa bacana, eis um belíssimo exemplo do que ele pode fazer com um ser humano.

"Os escravos foram alçados ao mesmo nível dos cristãos, o que é contrário aos desígnios divinos e à ordem da natureza, que dividiu as raças de acordo com a cor da pele. Para qualquer cristão honesto, aquilo equivalia a ser posto de joelhos e ter os braços presos por correntes". Sabe quem escreveu a frase acima? Anna Steenkamp. Em que ano? 1838.

"Num determinado momento, surgiu na tela um homem branco que se aproximou de um negro e estendeu-lhe a mão. O filme estava sendo exibido na Universidade Orange, exclusiva para estudantes brancos. Entre vaias e gritos de protestos, todos os estudantes se levantaram e saíram da sala. A projeção foi interrompida. Será que a nossa censura não poderia ser mais atenta, evitando que cenas tão infames fossem exibidas em telas de cinemas?". Sabe quem escreveu essa besteira? Um leitor do  jornal Die Burger.

"Primeiro, deitaram-me numa maca de aço, ligaram a corrente elétrica e eu comecei a me contorcer em convulsões. Atiraram água gelada em mim, para que eu recuperasse a consciência. Depois, dois policiais penduraram-me no teto, de cabeça para baixo, e dois outros se puseram a chutar a minha cabeça, como se ela fosse uma bola. Não sei o que se passou em seguida". De quem é esse depoimento? De Sikave Mashiklehele, no processo de trinta africanos em Krosdorpo.

quarta-feira, 8 de dezembro de 2010

Leitura para nobres

          Tiririca voltou à tona. Deve estar adorando. Venhamos e convenhamos, estar na mídia é tudo o que um político quer. A imprensa está para o eleito como o palco está para o palhaço. É ali que ele deita e rola; literalmente. Tiririca, além de palhaço, foi elegido pelo povo a deputado. E se foi pelo povo, ganhou nas urnas, voto direto. Verdade seja dita: nem quando se apresentava em “horário povo” da Record ele foi tão visto. Chamo de horário povo o que muitos denominam horário nobre. Cá entre nós, esse papo de nobreza é coisa de 1808. Pelo menos para a gente, republicanos desde 1889. Se bem que tem um monte de abobados que adoram falar em nobreza. Horário nobre, bairro nobre e até atitude nobre. Já percebeu, simpatia, como muitas vezes elogiamos uma boa ação: “Fulano teve uma atitude muito nobre”. É como se educação fosse coisa palaciana. Hummm.

          Há quem concorde com a ideia do marechal Deodoro da Fonseca de que “República no Brasil é desgraça completa”. Para o proclamador da república, por increça que parível, a nação canarinho precisava de educação para sair do imperialismo para a república. Conheço centenas de pessoas, colegas minhas, que pensam da mesma maneira. Calma, calma, não estou dizendo que sou contra nem a favor. Sei que precisamos de educação. Sou favorável às instituições de ensino superior. Tanto sou que até hoje fico indignado com o STF por ter desobrigado o diploma para quem quiser exercer a função de jornalista. Só não entendo esses meus colegas porque eles brigam pela democracia republicana e fazem propaganda monárquica. Ou chamar de nobre tudo que é bom não é uma maneira de exaltação a monarquia?

          O fato é que Tiririca voltou. E vem um camarada dizer que o cearense sabe ler, mas não é capaz de entender um texto. Caro amigo, caríssima amiga, quantos dos nossos políticos são capazes de compreender um texto? Dá um Saramago para cada parlamentar ler e dois dias depois faz um debate para ver o que eles apreenderam da obra! Ora bolas, se os requisitos para se candidatar é saber ler, ter dinheiro para comprar votos e cara de pau para mentir, nossos homens públicos – salvo raras exceções – os cumprem. Não importa se sabe ler um carta infantil ou um Pablo Neruda; não importa se a origem do dinheiro é lícita ou enlameada; não importa se a mentira é verossímil ou deslavada. O que vale é se eleger, não importa como e nem quem. O povo que se dane. Ah, nobreza útil, ah, nobreza inútil.

segunda-feira, 6 de dezembro de 2010

Noel e o Fluminense

O Natal está aí. Não tenho como fugir do velhinho. O sacudo mascote do Internacional chegou com força. Ressurgiu do escritório publicitário onde passa o ano inteiro criando estratégias para fazer os mortais se endividarem. E nisso o malfado é fera. Ora, muito antes - e bota antes nisso – dos cientistas clonarem a ovelha Dolly, o aposentado já fazia suas aparições simultâneas nos continentes. E qual era a técnica usada por ele? A clonagem. Na áfrica, onde a população é sabidamente negra, ele aparece com a brancura dos povos “superiores”. Na América Latina não importa se os moradores são desdentados ou moram em favelas, Noel se apresenta com um sorriso de quem acabou de utilizar a mais moderna técnica de clareamento dental. Até no Oriente Médioo danado do velhinho tem a audácia de marcar presença. Tenho certeza que foi o safado do Noel quem inspirou os cientistas a entrarem pelo caminho da clonagem.

Eu disse que Noel foi audacioso em dar as caras no Oriente Médio porque até um estudante universitário brasileiro sabe que foi lá que Jesus Cristo nasceu. E, venhamos e convenhamos, se o Natal é para comemorarmos o nascimento do menino-Deus, pelo menos no Médio Oriente Noel tinha que ser desmascarado. Não, ninguém ousa enfrentar o alvirrubro. Desconfio que ele tem parceria com a CIA, com a KGB – se é que ela ainda existe – e com os principais serviços de espionagem do mundo. Sem falar na relação comercial que o safado mantém com federação mundial do comércio. Há quem diga, embora eu tenha sérias dúvidas, que o Vaticano não abre o jogo e conta a verdade sobre Noel porque recebe uma comissão por cada milhão de dólares comercializados nas festas natalinas.

Eu, na minha insignificância, fiz, e faço, alguns protestos. Insisto em berrar que Papai Noel é uma artimanha capitalista para fazer os bobões gastarem o dinheiro que têm e o que ainda vão ganhar. Pouco adianta. Meu discurso formiguinha não vai um metro a diante. Hoje cedo, parei em um semáforo e se aproximou de mim um mendigo travestido de Papai Noel. Fiquei na dúvida. Será que era ele mesmo? Bem, depois que o Fluminense foi campeão brasileiro, tudo pode acontecer, até Noel pedir moedas.

sexta-feira, 3 de dezembro de 2010

O sabor das cores

       Verde limão, azul calcinha, rosa pink, amarelo ouro e branco. Pense numa combinação digna de Tiririca. Assim eles passaram diante dos meus olhos. Ninguém me disse, eu vi. Vi com esses meus observadores que verão, domingo, o Fluminense ser campeão brasileiro de futebol. Calmos, serenos e tranquilos – se bem que acho esses três adjetivos a mesma coisa. Aquela infusão de cores do tipo mamãe não me perca na neblina gritaram exigindo minha atenção. E eu não me fiz de rogado. Não dei uma de político pós- campanha. Não, dei-lhes a devida atenção. Atenção mais do que merecida, afinal não é todo dia que podemos ver umas beldades daquelas desfilando em via pública. Parei.


Para ser sincero, eu já estava parado quando eles apareceram. E parado fiquei. Parado feito jumento quando embirra. E por falar nos quadrúpedes, ontem ouvi mais uma falácia própria dos ignorantes. Estava esse babaca aqui em um jantar, quando um colega afirmou que os nordestinos comiam carne de cavalo. Eu, cheio de delicadeza, fui direto ao escutador de novela do camarada.

- Em qual cidade do nordeste você comeu cavalo, animal?

- Não, eu não comi, Gile. - Me falaram.

- E quem foi o jumento que falou tal asneira? – Questionei tirando logo a possibilidade que ele tinha de dizer que foi um parente, um amigo ou alguma outra pessoa do seu círculo íntimo.

- Nem lembro, acho que eu era muito novo. Devia ter uns 15 anos na época. – Respondeu tentando, sem perceber, jogar a informação para um tempo remoto que não merece credibilidade.

- Quem vai pela cabeça dos outro é piolho, meu amigo. Aonde já se viu!, nordestino comendo cavalo!?

Voltando à festa das cores, fiquei tão embasbacado que nem percebi o sinal ficar verde. Continuei saboreando o par de tênis depois que ele cruzou a faixa de pedestre.

terça-feira, 30 de novembro de 2010

Papai Noel visita Câmara de Vereadores de Florianópolis

Papai Noel chegou mais cedo na Câmara de Vereadores de Florianópolis. E trouxe, no saco, 7 novos terneiros.

O número de vereadores que era de 16 vai saltar para 23. Isso mesmo. Um aumento de 43,75% na quantidade de mamadores.

Papai Noel, meu filho, assim o senhor mata o contribuinte da capital. Papai Noel, meu garoto, vossa excelência está bancando o Tiradentes com o pescoço do povo, é?

A câmara aprovou ontem, o incremento de 7 vereadores.

Assumindo o controle do teu morro

          Ninguém fala em outra coisa, aqui no Brasil: é só Rio, Rio, Rio. E não fugirei à regra. Não é, porém, da Cidade Maravilhosa que farei referência. Não, é ao teu Rio de Janeiro, ao meu e ao nosso Rio. Antes te pergunto: Como é que os morros cariocas chegaram à situação em que estão? Se você viu televisão, leu jornal ou escutou rádio, sabe que foi devido a ausência do poder público. Sem o mando do Estado, os traficantes ditaram as regras. E como é em nossas casas?
          Outro dia eu estava assistindo a um programa televisivo de domingo à noite e me apareceu uma família moderna. Uma mãe com três ou quatro filhos. O pai, que não é bobo nem nada, saiu pela tangente. No máximo paga uma pensãozinha. E muitos deles não dá mais um tostão quando o filho completa a maioridade. A mãe que se vire. Chamou minha atenção uma das filhas, por volta dos 15 anos, que estava com o namorado. Ela frisou que a não aceitava a mãe colocar um namorado dentro de casa. E a mãe, idiota, ficou mostrando os dentes. Enquanto isso, a pirralha estava com o namorado no sofá. Ou seja, a mãe que paga as contas não manda na casa, quem manda é uma babaquinha que ainda nem perdeu o odor das fraudas. E na tua casa, como é?

          Dia desses um rapaz, que mora com a mãe, disse que acha normal mandar a genitora tomar no “pi”. Outro, que mora com o pai, afirmou que já mandou o velho para a pqp. O que é isso? É inversão, meu chapa. Quem deveria ter o domínio no lar perdeu o pulso. O despreparado, o desmiolado, assumiu o comando. E o resultado? O resultado podemos acompanhar nos jornais diários. Aproveitando a deixa, será que não é hora de pais e mães retomarem o controle de seus morros?

segunda-feira, 29 de novembro de 2010

Marcelo D2 é fanfarrão

         Gente do céu, a coisa tá feia no Brail. Tem muito pai de família aumentando a mesada dos filhos em até 500%. Não tem aumento de salário que acompanhe esse galope. Tudo por causa da invasão do complexo do Alemão. Claro, com a apreensão de mais de 40 toneladas de maconha, até o momento, e de centenas de quilos de cocaína, o preço do produto para o consumidor final disparou. E como fica um guri que não trabalha e precisa manter o vício? Se bem que essa gente odeia ser chamada de viciada. De maconheiro, então, nem se fala. A verdade é que a pressão estoura no bolso dos pais. Para não ver seus pimpolhos deprimidos, os supostos donos de casa sacrificam o lazer, e até o comer, e entregam o fruto do suor para os meninos.
         Aí vem o Marcelo D2, dizer que apoia a ação da polícia. Apoia, Marcelo?, usando droga? Poxa, meu camarada, isso é que chamo de fanfarrão. O cantor do "legalize já" faz apologia escancarada ao uso de tóxico e vem querer dar uma de bom moço?! Daqui há pouco vai aparecer Adriano - aquele que jogava no Falamengo e que fazia festas com traficantes da Vila Cruzeiro - alardeando que a PM pode contar com o apoio dele! Continuo com a campanha: fique um mês sem fumar e sem cheirar e quebre as pernas do tráfico.

sábado, 27 de novembro de 2010

Campanha para a acabar a guerra no Rio

Atenção, você que acha que a guerra no Rio de Janeiro precisa ter um fim. Desde já, quero dizer que não é a polícia quem resolverá a questão. Nem exército, nem marinha  e nem a aeronáutica. O máximo que essas forças podem fazer é expulsar os traficantes dalí. O poder de resolver a questão está com você. Como? Combatendo o uso de maconha e cocaína, pelo menos. Sim, porque não adianta prender os traficantes cariocas e deixar os consumidores livres para adquirir o bagulho de outros. O viciado comprará droga em São Paulo, na Bahia ou em Porto Alegre. Meu caro, se tem traficante é porque tem usuário, vamos combinar.

Por isso eu peço para você, que é usuário de drogas: passe um mês sem fumar. Passe um mês sem "cheirar".
Peço a você, pai, a você, mãe: impeça seu filho de usar pó, evite que ele fume o "baseadinho" diário.

E não me tenha por radical; por favor. Só tenho ficado irritado quando escuto pais de usuários de drogas se dizendo alarmados com o caos do Rio. Acho um tremendo cinismo quando vejo consumidores de cocaína e de maconha fazendo um discurso de interessados em ver o problema carioca acabar. Fala sério. Se você, paisano, não fuma e nem cheira, deve ter, tenho quase certeza, um parente que faz uma coisa ou outra; ou as duas. Leve esta campanha adiante. Um mês sem drogas, é o que precisamos para quebrar as pernas do tráfico. O resto, paisano, é balela. É esparadrapo na ferida. Depois do resultado a gente avalia o impacto.

quinta-feira, 25 de novembro de 2010

Solução para acabar com o crime organizado

          Hoje cedo, enquanto assistia as últimas notícias sobre a pouca vergonha que está acontecendo na cidade do Rio de Janeiro, tive uma ideia. Ela veio quando um comentarista de segurança explicou como os ataques dos criminosos são planejados. Segundo o camarada, os chefes do crime se comunicam por meio de celulares que entram clandestinamente nos presídios. Logo imaginei que a polícia, desorganizada, perdeu de novo. Segundo o especialista, o problema maior está no sistema prisional. Aí meus neurônios entraram em polvorosa.
          Mnha ideia consiste em juntar os quatro poderes em um grande complexo. Como? Contrata-se um arquiteto e um engenheiro dos bons, e não precisa mais do que isso. Se não, vira cabide de emprego. Projeta-se quatro grandes edifícios de, pelo menos, 20 andares dispostos de tal maneira que formem um quadrado. Aí basta uní-los através de extensos corredores. No bloco A, coloca-se o Executivo; no B, o Legislativo; no C, o Judiciário e no D o presídio. Os quatro poderes juntinhos. Só assim a bandalheira pode ser combatida. E ficará barato os trâmites envolvendo o crime.
         Imagine a economia que teremos pelo simples fato de não precisar mobilizar um aparato gigantesco para transportar um preso?! Da cela, vai ao julgamento e depois volta para a cela, a pé. A segurança dispensada aos três poderes legalizados será aproveitada para controlar os presos. Sim, porque enquanto os presídios forem contruídos no meio da pobreza, esqueça a polícia, meu chapa. Para ficar dez, é só construir um anexo que sirva de escola aos filhos dos políticos, e dos magistrados.
               Meu medo é de que os quatro poderes se unam. Aí dane-se o mundo, afinal de contas eu não me chamo Raimundo.  

terça-feira, 23 de novembro de 2010

Bicho também é gente

          Ontem fui criticado no blog de um amigo meu. No letrasdatorre ele comentou sobre um camarada dele que estava indignado – talvez esse não seja o adjetivo mais apropriado – com o nome que dou a alguns dos meus animais. A razão da crítica era meu terneiro Gerineldo Marquez. O homem não se conforma com um touro carregando nome de pessoa. Aí me desculpe, querido, mas bicho também é gente, como diria a sábia, filósofa e poliglota Cristininha no auge dos seus sete anos de vida. Gerineldo não é, saliento, um bicho bruto. É um exemplar lapidado da raça Jersey. Não é, muito menos, um ignorante; atende pelo nome e tem vontade própria. Não merece, assim, um nome?

         E não coloquei qualquer nome no bovino. Homenageei o coronel Gerineldo Marquez, retratado pelo Nobel de literatura Gabriel Garcia Marquez. E te pergunto, paisano: você conhece algum Rodrigo? E Rafael? Arnaldo, Renato, Fred, Jair, Osório, conhece? Eu conheço uma ruma desses. Um magote de celerados que fuma maconha com o dinheiro dos pais, toma cachaça e volta para casa de madrugada perturbando a família. E quando a mãe reclama da vida que levam, eles mandam-na “pi”. Deixo o "pi" para que o leitor substitua-o pelo palavrão que lhe aprover. Conheço uma centena deles que, ao invés de assistir a aulas – em uma faculdade bancada pelos burros de cargas que os geraram -, tomam cerveja no barzinho mais próximo. Nem por isso eles perdem o direito ao nome que carregam no registro. Poderíamos chamá-los, todos, de potenciais delinqüentes, se já não o são. Não, todos merecem um nome. E meu Gerineldo, que nunca me deu uma cabeçada, que jamais me deu um coice, que acompanha-me sempre que é chamado para uma caminhada no pasto, não é digno de um nome? Fala sério, Valério.

         Invoco os bichos, como já fizeram os Titãs, a saírem dos lixos e invadirem o mundo dos cidadãos civilizados. Só não vou fazer como Eduardo Dusek, e pedir para que troques o teu cachorro por uma criança pobre. Seria hipocrisia minha. Se você quer ter uma criança gerando ou adotando, é uma questão que só diz respeito a você. Mas se desfazer de um cachorro, de um cavalo ou de um bezerro é, no mínimo, burrice.

segunda-feira, 22 de novembro de 2010

O mundo tá perdido

          Definitivamente, este mundo não tem mais jeito. Estou em uma clínica, na sala de espera. Localizada no Centro de Florianópolis, tem uma sala de espera digna de... digna de uma crônica. As atendentes, em número de três, aparentam tranqüilidade. Para ouvi-las é preciso estar pelo menos um metro próximo das moças. O granito do piso está apto para receber um colchão e servir de cama. As paredes brancas não têm uma manchinha, sequer. E olha que procurei por uma. E tem uma prateleira que me chamou a atenção. Nela eu pude encontrar jornais do dia e revistas. Diferente da maioria das clínicas que conheço, essa tem revistas atuais. Nada de ler o que ninguém mais quer. Nada de folhear páginas e descobrir, no meu caso com tristeza, que o Flamengo foi campeão brasileiro. Os semanários são os últimos lançados no mercado.

         Não consigo conter o ímpeto e avanço sobre as revistas. Ui, tinha uma Veja na minha frente. Desvio-me das presas afiadas do panfleto e agarro-me a uma que achei mais interessante. Dou uma espiada nas matérias e resolvo pegar outra. É quando percebo que ninguém – isso mesmo, ninguém – visitou a prateleira enquanto eu estava lendo. A sala tinha dezoito cadeiras para clientes. A metade estava ocupada. Foi quando escutei uma voz irritante vindo da parede acima das revistas. Uma televisão exibia oi programa de Ana Maria Braga. E os oito presentes estavam vidrados na global. Tinha um senhor – com seus sessenta e poucos anos – que chegou a deslocar o tronco para a frente, na tentativa de chegar mais perto da tela. Ele parecia beber um vinho do Porto. Outra senhora, ao meu lado, tinha uma expressão fisionômica que lembrava um torcedor que viu o time golear o adversário.

         E tinha também um camarada que sentava com as costas na cadeira. Estava quase embriagado com o programa televisivo. E os jornais, pobres jornais, choravam. E tem gente querendo tomar o mandato de Tiririca alegando que o palhaço não sabe ler!

sábado, 20 de novembro de 2010

O Corinthians será o capeão brasileiro de 2010

Hoje é sábado e quero aproveitar para dar o meu palpite de como será encerrado o campeonato brasileiro de futebol 2010. Faltando três rodadas eu antecipo o campeão, quem vai para a Libertadores e que cai para a segundona.

1 Corinthians 70


2 Cruzeiro 69
3 Fluminense 69
4 Botafogo 62
5 Grêmio 61
6 Santos 58
7 Atlético-PR 58
8 Internacional 54
9 São Paulo 53
10 Palmeiras 50
11 Vasco 49
12 Atlético-MG 46
13 Ceará 46
14 Avaí 44
15 Atlético-GO 43
16 Vitória 43
17 Guarani 41
18 Flamengo 40
19 Prudente 33
20 Goiás 32

 
Quando terminar o campeonato, pode cobrar meus pitacos. Mas que o mengão vai cair, ah, vai.

sexta-feira, 19 de novembro de 2010

O brasileirão está pegando fogo

          O retrato do futebol brasileiro pode ser visto na tabela de classificação da série A. Tive a audácia de classificar nossos times em três grupos. E permita-me, por favor, dizer que os times são nossos. Primeiro, dê, paisano, uma olhada na pontuação deles:


1 Corinthians 63
2 Fluminense 62
3 Cruzeiro 60

4 Atlético-PR 56
5 Botafogo 56
6 Grêmio 54
7 Santos 52
8 Internacional 51
9 São Paulo 51
10 Palmeiras 50
11 Vasco 46
12 Ceará 45

13 Atlético-GO 40
14 Flamengo 40
15 Atlético-MG 39
16 Vitória 39
17 Avaí 37
18 Guarani 37
19 Goiás 32
20 G. Prudente 27



         Os três primeiros, pintadinhos de verde, são os únicos capazes de lutar pelo título, como estão fazendo. Qualquer um deles poderia ser capeão que estaria tudo certo. São do mesmo nível. Têm condições, embora não sejam nenhum bicho papão, de representar o futebol brasileiro no exterior.

          Do Atlético/PR ao Ceará, o grupo amarelo, é o grupo dos que não cheiram nem fedem. Tiveram oportunidades de melhorar na tabela, mas na hora H, amarelaram. Não são tão ruins, estão, entretanto, longe de serem competitivos.

          Os oito últimos, os vermelhinhos, estão deixando os torcedores vermelhos de raiva e de vergonha. Eles são o que os boleiros costumam chamar de "baba". O Grêmio Prudente, último colocado, não sei por qual cargas d'agua ficou tão para trás. É do mesmo nível dos outros - ou seja, fraquíssimo. Mereciam cair todos para a Série B. Não vou negar que torcerei para que o time do Guga, o Avaí, escape. Por outro lado darei uma festa se o time do Ricardo Teixeira - presidente da CBF - caia para a segundona. Vai dizer que não sabes por qual time o Teixeira torce?! Vou dar uma dica: é o time que mais tem pênalti marcado - irregularmente - a seu favor. Segunda: é preto e vermelho. Não preciso dizer que é carioca, preciso? O fogo está aceso no Brasileirão. Quatro desses vermelhinho arderão no fogo da Série B em 2011. Torce, torcedor, torce.

quinta-feira, 18 de novembro de 2010

Meus heróis não morreram de overdose

          Vamos deixar uma coisa bem clara: meus heróis não morreram de overdose. E posso relacionar o nome de alguns deles, para que possas, paisano, confirmar o que digo:

Tex Willer – Um ranger (espécie de polícia especial) durão que estava sempre pronto a lutar pela justiça. É bem verdade que o cara matava muita gente, mas como dar uma flor para quem lhe cuspia balas de revólver?

Ken Parker – outro justiceiro que, com um rifle na mão, era imbatível. Li, em 1978, o primeiro episódio do cara lançado no Brasil. E tinha uma frase que nunca esqueci: “Onde a bala é a lei, meu gatilho dá a sentença”. Imagine o que diria um herói brasileiro dos nossos dias: “Onde o dinheiro é a lei, eu compro o magistrado”.

Zagor – um herói que vivia na floresta fazendo valer a lei com uma machadinha. Eu, que morei, quando criança, muito tempo em um sítio, talvez me visse na figura do camarada. Imagine um zagor moderno: cigarro de maconha na boca, berrando mais palavrões do que Wanderlei Luxemburgo e dirigindo um carro com o som nas alturas.

Moisés – Sim, Moisés, o legislador hebreu. Eu ficava fascinado com a maneira como ele guiou os israelitas em busca da terra prometida. Na versão de hoje podemos destacar alguns gurus que, com a missão de conduzir as almas atribuladas a um reino de paz, nadam em dinheiro.

Paulo – O apóstolo que deu a vida para levar a religião cristã ao império romano. Hoje tem muito Paulo pregando um Cristo desapegado da riqueza. Tais pregadores, no entanto, não dispensam o carro importado e casas luxuosas.

         Por isso afirmo: meus heróis não morreram de overdose. Lamento quando vejo seguidores de heróis que morreram em tal situação.

quarta-feira, 17 de novembro de 2010

Príncipe William?, que nada, quem vai casar é Gerineldo

          Gerineldo está procurando uma namorada. Eu, particularmente, sou contra. Acho o danadinho muito imaturo. Percebo-o muito apaixonado pela Jipão. Essa, sim, ao meu ver, está bem mais preparada para um relacionamento amoroso. Os dois estão sempre juntos. Quem os vê, diz logo que “aí tem coisa”. Não passa, porém, de um namorico pueril. Mas como diz a sabedoria popular, “onde há fumaça, há fogo”. E quem sou eu para contrariar a voz do povo. Falei sobre esse suposto enlace para um colega e ele ficou sem entender nada. Reclamou que não sabia quem era Gerineldo e muito menos Jipão. Veja só.

         Expliquei-lhe que Gerineldo Marquez é o nome de um terneiro Jersey que tenho. Jersey é a raça do bonitão, para te poupar o esforço de pesquisar no Google. Jipão é a bezerrinha da mesma espécie. Ele, cá entre nós, achou estranho eu dar nome aos bois e tratá-los como se fossem gente. Fiquei, juro por tudo que tens respeito, chateado com o posicionamento do camarada. E disse-lhe que os bichos têm, sim, muito valor para este escriba que vos fala. De nada adiantou eu dizer que os nomes que coloco neles são, em geral, significativos – Gerineldo Marquez, por exemplo, é um personagem do livro Cem Anos de Solidão, de Gabriel Garcia Marquez. Meu amigo disse que não se interessa por coisas sem importância, apenas por aquelas que têm a ver com o mundo dele. Não ficou claro para mim o que significa “o mundo dele” e tasquei-lhe uma pergunta:

- Sabias que o príncipe William vai casar?

- Claro, com Kate Maddleton – respondeu.

- Conheces William? – Alfinetei.

- Não. – disfarçou.

- E a futura esposa dele, é tua amiga? - Girei a faca na barriga do homem.

- Também não. – cambaleou.

         Aí eu não perdi a oportunidade: “Vem cá, oh companheiro. Tu vens dizer que não se interessa com a história do meu bezerro porque ele não tem a ver com o teu mundo. E a família real britânica, tem?”. O indivíduo recolheu-se a insignificância de um latino portador de complexo do terceiro mundo e tratou de se despedir de mim. Aí eu me lembrei daquela música de Belchior: “Eu sou apenas um rapaz, latino-americano sem dinheiro no banco...”. Aonde já se viu, ignorar Gerineldo, que mora aqui perto, e saber detalhes de um “nobre” inglês!?

terça-feira, 16 de novembro de 2010

Tudo é permitido, desde que escondido

          Retornei a Floripa ontem no fim do dia. Depois de um feriado regado a livros, gado e alguns parentes. E resolvi dar uma caminhada no calçadão da Beira-mar Norte. O vento frio, o céu acinzentado e o vai-e-vem das pessoas indicavam que o inverno, teimoso, está prestes a ser expulso. Falta, certamente, uma primavera mais ousada que lhe diga: “Cai fora, animal”. Mesmo assim, caminhei. Foram cinco quilômetros de passadas largar capazes de ativar as glândulas sudoríparas. E não consigo fazer o passeio sem prestar atenção ao meu redor. Olho para o mar, analiso o movimento da maré e resmungo a cada esgoto que vejo esbofetear o pedaço de Atlântico. Apuro a audição para saber o tipo de diálogo que os passantes trocam. “Não acredito, amiga, que ele foi capaz de fazer isso”, lamenta uma moçoila. “Só tem um jeito: cortar a internet”, sentencia um pai incapaz de educar o filho. “Você é a razão da minha vida”, mente um guri nos ouvidos da namoradinha que aparenta ter seus 14 anos. Um motoqueiro joga a arma que dirige contra um motorista lerdo que não aprendeu que lugar de tartaruga é na faixa da direita. E tem mais isso, mais aquilo e outras cositas.

         Em uma curva, próximo a um tradicional quiosque, vários carros estão estacionado. Um modelo 1000 está com o porta-malas aberto. Ao contrário dos demais, a frente está de costas para o mar. Razoes obvias: dentro da mala tem um casal com as pernas penduradas para fora apreciando a paisagem líquida à frente. Ele tem, calculei, 60 aninhos. Ela, certamente, a mesma idade, embora aparentasse bem mais. Se bem que, por estarem posicionados contrários aos demais motoristas, ela até que podia ser, de fato, mais velha do que ele. E, se era, justificava-se a postura opositora. Em uma sociedade em que tudo é permitido, desde que escondido, e tudo é proibido, desde que seja feito no escuro, o pensar contrariamente é, quase sempre, desprezado. O fato é que os brotos fumavam seus cigarrinhos sem se importar com os atletas de plantão. Não que eu seja a favor do fumo; sou, sim, favorabilíssimo a confrontação de idéias. Venhamos e convenhamos, simpatia, sem essas rusgas seríamos semelhantes a cardumes de tainhas. Falando em peixe, que fome!

quarta-feira, 10 de novembro de 2010

Desgraçadas ruas

          Ele vinha a passos apressados no calçadão da Felipe Schmidt, Centro de Florianópolis. Não devia ter mais que dezoito anos. Os cabelos, tenho certeza, não conversavam com um pente havia dias. A pele do rosto quase não cobria o zigomático. A sola do pé já devia estar acostumada ao contato direto com o chão. Será que pesava 50 quilos? Talvez, osso pesa pra caramba. As roupas, ah, as roupas, pareciam ter saído de dentro de uma garrafa. Garrafa suja, diga-se de passagem. Os olhos, entretanto, corriam da esquerda para a direita procurando o que talvez só o rapazola soubesse. Afundados na cavidade ocular, arrastavam a cabeça toda vez que se mexiam. E a cabeleira negra ondulava. Ao vê-lo, ainda de longe, aquela correria do olhar chamou minha atenção. O que buscava?

          O cérebro, de certo, ainda trabalhava, apesar de seu possuidor parecer mais um autômato. Teria pai o tal guri? E mãe? Certamente, não. Alguém projetou irresponsavelmente, alguém pariu. O que não significa que são pais. Claro, é uma questão de achismo. Eu acho de um jeito, outra pessoa pensa diferente e uma outra concorda. Como aqui eu escrevo o que eu acho, pois a crônica é minha, aquele piá não tem pai e muito menos mãe. Se tivesse um pai, leitor e leitora, não estaria naquela situação. E não me tenha por ignorante, muito menos por intolerante. Nem me xingue de insensível, por favor. E se você me perguntar se os pais são os culpados pela decadência de um ser que um dia foi anjo, não penso duas vezes antes de responder: sim, os pais são os culpados. E digo sem pensar porque já pensei bastante.

          Lógico, se os pais do moço que vi na rua morreram quando ele ainda não tinha os primeiros dentes, isento-os de culpa. Se estão vivos, simpatia, deveriam ser responsabilizados. E talvez até estejam arcando com um alto preço pela miséria do filho. Talvez tenham passado as últimas noites sem dormir. Talvez tenham gasto os recursos que tinham na busca de tratamento para o rebento. Não vou dizer “bem feito” porque talvez eles sejam a continuação de uma geração desgraçada. Desgraçada por um discurso que permite aos filhos fazerem o que bem entendem, como se os menores tivessem condições financeiras e psicológicas de arcar com as conseqüências. Desgraçadas com a falta de limites, com a falta de autoridade paterna. Desgraçados pais, desgraçados filhos e desgraçadas ruas.

segunda-feira, 8 de novembro de 2010

O presente que chegou atrasado

          Ontem fui a um almoço de aniversário. Aqui mesmo, em Florianópolis. Não vou divulgar o nome do festeiro porque prometi que não o faria. Curioso, como sou, e sem ter muito o que fazer, fui dar umas espiadas nos presentes que o gurizão ganhara. E entre suspiros falsos de “ah, que coisa linda”, ou “quanto bom gosto”, deparei-me – juro por tudo que tu tens de sagrado! – com um despertador. Confesso que fui obrigado a parar. Parar e refletir. Sim, meu espírito se inquietou com o mimo. Não era um despertador qualquer, diga-se de passagem. Tocava diversas músicas. Marcava a temperatura, umidade relativa do ar e o escambau. Tinha, entretanto, uma função que me incomodou: despertar. Meu Deus do céu, pensei com meus cadarços, para que o desgraçado desse despertador vai servir? Gente, o anfitrião estava comemorando 80 primaveras. Agora, seja sincero, qual a utilidade da geringonça? O moço mora na praia, na parte ínsula da capital catarinense. Trabalhou dos 13 aos 60 anos. Há 20 está aposentado.

          Dos 30 aos 60, morou em Brasília. Trabalhava diuturnamente em uma conhecida instituição bancária. Diuturnamente, sim. É que funcionário de banco dorme banco, acorda banco e come banco. Sei que há exceções, mas não era o caso desse piá de quem estou comentando. Na capital federal, cercada de cerrado, acordava todos os dias ao som de um velho despertador. Despertador esse que, por questões óbvias, já se escafedeu. Ao se aposentar, o homem, natural de Campos Novos, no Meio-Oeste do Estado natal do tenista Gustavo Kuerten, lembrou do ilhéu onde fora criado. Combinou com a esposa e comprou um terreno na Praia da Daniela, um balneário de Floripa. A senhora, dada às artes, fez o desenho da casa. Meses depois o ninho estava feito. “aposentadoria, aí vou eu”, realizou-se o ancião.

         Sem hora para acordar, sem hora para almoçar e sem hora para “p” nenhuma. Deixei o p ao seu gosto, leitor. Caso conheças o camarada de quem falo, podes substituir a consoante por aquilo que pensastes. Tenho certeza que ele adoraria. Se fores mais casto, troques o “p” por “porcaria”. A verdade é que o tio da Isa – e é verdade, ele tem uma sobrinha que atende por Isa – não quer nem saber de horário. As poucas vezes que assume compromisso é quando vai à igreja atrasado. Aí vem um desnaturado e oferece-lhe um despertador como presente de aniversário?! Não interessa se a maquininha tem mil e uma funções. A missão principal da megera é despertar. É marcar horário e dizer: “acorda, preguiçoso, você tem obrigações a cumprir”. Vamos combinar, é desumano falar assim com o esposo da Verinha. E fiquei horas pensando na utilidade daquele despertador. E aproveito para esclarecer uma coisa, paisano: no meu aniversário de 80 anos, por favor, não me dê um despertador. Você corre o risco de ser tocado para fora da minha casa com presente e tudo. Ah, tem mais: nem pense em levar um pijama - outra lástima.

sexta-feira, 5 de novembro de 2010

Um idiota politicamente correto

          E não venha me pedir para ser politicamente correto. Detesto essa expressão. Acho que ela cultua a hipocrisia. E o faz descaradamente. Reconheço, juro por tudo que tens, um hipócrita de longe. Mas só quando ele conversa é que tenho certeza tratar-se de um. O camarada gosta de todo mundo, votou em todos os candidatos da última eleição presidencial e afirma que adoraria ter nascido no nordeste, embora seja gaúcho. Calma, calma, não “priemos cânicos”. Usei o gaúcho como poderia ter dito goiano, carioca ou paranaense. Eu precisava de um exemplo, paisano. Voltemos ao fingido. O mal-acabado ri até de piada sem graça; só para ser simpático. E é capaz de dar os parabéns a um rapaz de 22 anos que acaba de ser pai, embora esteja no seguro desemprego. Já vi um “agradável” iludindo uma senhora que acabara de sair do salão de beleza. Gente do céu, foi terrível. “Seu cabelo ficou divino”, exclamou. E eu, olhando para aquele penteado do tipo miojo, fui mais delicado: “Não quer tentar um estilo Ronaldinho?”
          Outro dia fui a uma reunião aonde o objetivo dos presentes – exceto de um deles - era “descer o sarrafo” no exceto de um deles. Entendeu o jogo de palavras, não é? Opa, já podes ler a Bíblia. Falo assim porque já ouvi trezenas de pessoas dizendo que não lêem o livro sagrado dos cristãos porque não o entendem. Já perguntei para alguns desses: “Quantos livros você lê por mês? Lê Saramago? Lê José Lins do Rêgo? Ou limita-se a passar os olhos em livros de auto-ajuda?” Fala sério, o cara só assiste televisão e vem dizer que a bíblia é difícil de ser entendida! O que ele não sabe é ler. E, diga-se de passagem, pouquíssimas pessoas que seguram uma bíblia sabem ler. Conheço uns três que a leram e entenderam o enredo. Conheço centenas que leram e viraram religiosos. E não preciso afirmar que ficaram intolerantes, preconceituosos e manipuláveis. Voltemos à reunião.

Na hora de malhar o exceto – chamemos assim a vítima – todo mundo era delicado com as palavras. “Não é nada pessoal”, salientavam. E eu com meus botões: “como não é pessoal? Se emito uma opinião, e sou uma pessoa, minha opinião é, e sempre será, pessoal”. O discurso politicamente correto fala mais alto. E todo mundo faz de conta que acredita. Ai de quem ousa contrariar um fingido desses. Lembra daquela história do rei que vestiu uma roupa invisível, contada por Hans Christian Andersen? Todo mundo achou a roupa maravilhosa. Foi preciso uma criança para revelar a farsa. No conto, todos riram da nudez real mostrada pela sinceridade infantil. Se a história fosse hoje, iriam chamar o menino de burro, idiota e grosso. Tudo em nome do politicamente correto.

segunda-feira, 1 de novembro de 2010

É preciso conhecer para se impor

          Quando Zobaida desceu do caminhão, os moradores da área já estavam aguardado-a. O interessante foi ver Jipão, menor do que a moral do petista José Dirceu, correr atrás da novata. E esta, senhoras e senhores, sem saber ainda onde estava, nem o grau de periculosidade da singela Jipão, pôs-se em fuga. Depois de mais de 500 quilômetros de viagem, afastada dos pais, dos irmãos e de tudo quanto é parente, Zobaida estava visivelmente desnorteada. A fome não impedia que ela abaixasse, vez em quando, a cabeça e se alimentasse. Até agora não sei se Jipão agia motivada por um espírito arengueiro – daquele que povoou as cabeças dos dois candidatos a presidência do Brasil -, ou se tudo não passava de mera curiosidade. Digo isso porque até o coronel Gerineldo saiu ao encalço de Zobaida. Logo ele, um pacifista que de belicoso só tem o título militar. Se era por curiosidade ou não, Zobaida não pretendia descobrir, e galopou.

          Enquanto corria, Zobaida foi descobrindo cada canto do novo lar. E quando viu que os moradores marchavam em direção a um platô no centro da propriedade, seguiu-os. Comida especial de boas vindas aos três noviços. É que Zobaida não viera sozinha. Estava acompanhada de mais duas criaturas. Um macho e uma fêmea mais novos do que ela. Só aí que a ruminante pôde perceber a hierarquia do pedaço. Pirata ficou o tempo todo com o melhor lugar na mesa. Mel, essa parecia ser do segundo escalão. Jipão e Gerineldo, tadinho deles, ficaram por fora, feito pensamento de preso. Zobaida não teve dúvidas: - Aonde já se viu! Eu, nascida no lixo, vou perder pra saco sujo! - E tratou de tascar as guampas nos dois. Depois enfrentou a Mel. Não se deu lá tão bem, mas para quem acabara de chegar, foi um bom começo. Com o Pirata ela não teria chance, mas em pouco tempo não precisaria fugir da presença dele, imaginou.

          E eu, enquanto distribuía a ração, fiquei prestando atenção no comportamento dos animais. Parece que eles imitam o homem. Os seria o contrário? Ou será, ainda, que não se trata de imitar, apenas de um modo de agir próprio dos animais?

quinta-feira, 28 de outubro de 2010

Maconha, gay e aborto

Como é que vou resolver o problema do Brasil


Se em quem eu votei ontem, me mandou pra pauta que caiu?

Ora, não sei eleger nem síndico, que administra mixaria

Como escolher um presidente que acabe nossa agonia?



Olho os dois candidatos e penso com meus botões

Como fazer a escolha entre esses dois charlatões?

Uma é filha de um governo envolvido em mensalão

O outro é filho de quem vendeu até o sub-solo da nação.



Eita briga de foice no escuro, me acode, Deus do céu

Um tá tão velhinho, coitado, que pra mandá-lo à lona

Basta uma bolinha de papél.



Tenho pressa, Jesus Cristo, dá uma mãozinha, vai

A mulher fez tanta plástica, meteu botox na cara

Que se é coca ou se é fanta, acho que nem ela sabe mais.



Mas a eleição tá chegando e tenho que decidir

Fui ver o programa eleitoral, aprendi foi a mentir

Aonde é que vamos parar, se pra chefe da nação

Teremos que escolher baseado em religião.



De um lado o padre grita: "nessa eu não voto, não"."

Do outro o pastor esbraveja: "não vote nele, meu irmão.

Maconha, gay e aborto são o fiel da balança

Mas no fim da palhaçada, é mesmo o povo quem dança.

quarta-feira, 27 de outubro de 2010

Um repórter, um polvo e um burro

          O polvo morreu. Assisti, emocionado, a reportagem de hoje cedo na televisão. O repórter relembrava as previsões que o célebre molusco fazia antes de cada jogo da última copa do mundo. A música de fundo e o jogo de imagens quase levaram o profissional da notícia às lágrimas. Eu, confesso, quase chorei. De indignação, meu povo! Imagine só: ligar a TV pela manhã, para me inteirar de notícias importantes, e ter que agüentar um aprendiz de Nelson Rodrigues querendo me sensibilizar com a morte de um polvo. É muita futilidade para minha cabecinha de nordestino. Logo eu, que no fim de semana passado li Memórias de um Burro Brasileiro. A morte de Agapito, o burro brasileiro do livro, dá de 10 a zero no tal polvo. Sim, porque Agapito, assim como Jesus Cristo, São João Maria e Elvis Presley, morreu, mas ta vivinho da silva. Isso mesmo, o burro brasileiro, publicado em 1977, está atualizadíssimo.

          Burros e polvos à parte, como são fúteis as criaturas que habitam esse asteróide pequeno chamado Terra. Como são capazes de apequenarem-se cada dia mais, a ponto de fazer longas reportagens sobre um coitado de um molusco. O falecimento do Mister M da copa ocupou mais tempo do telejornal a que me refiro do que a morte do senador Romeu Tuma, ex diretor do DOPS (Departamento de Ordem Política e Social – órgão repressivo da ditadura militar ). Nesse caso, e só nesse, até que o polvo mereceu a dianteira. A verdade – e a verdade é a verdade, como diz minha amiga Cristina, de apenas sete anos – é que nem um deles me deixa saudade. Nem o polvo, um fanfarrão criado para iludir, mais ainda, o povo, e nem o Tuma, que durante muito tempo oprimiu o povo.

          Quem sabe o povo, sem polvo e sem Tuma, prefira as memórias de um burro brasileiro. Sheid, meu cachorro, insiste em me dizer que está tendo contato diário com burros brasileiros. Será paranormal, meu pulguento? Sai de retro, Sheid, vai conversar com os assalariados que estão fazendo campanha política para eleger tiranos.
 - O que? Já conversas com esse povo todo dia, Sheid?

terça-feira, 26 de outubro de 2010

O palhço não pode chorar

          É, simpatia, Tiririca está na berlinda. Estão querendo impedir o palhaço de assumir uma cadeira na câmara dos deputados. Aí já seria uma palhaçada. Onde já se viu o cara receber mais de um milhão e trezentos mil votos e não poder atender o anseio de quem o elegeu? “Mas ele é analfabeto!”, exaltar-se-á um afoito. “É ridículo ter um palhaço como deputado federal”, berrará um corno. Sim, paisano, só tendo muita guampa no coco para vomitar tanta besteira. O humorista Francisco Everardo Oliveira Silva ganhou com méritos. Deu a cara à tapa, como diria o mais antigo. Botou o braço na seringa, como diria o profissional de saúde. Botou alguma coisa na reta, como diria o mais desaforado. Escrevi “alguma coisa” para não deixar vermelha uma pudica leitora. Mas se você é um leitor traquina, pode substituir o “alguma coisa” por aquela coisa que está pensando.

          O jornal Folha de São Paulo de hoje informa que Tiririca pode até ser punido, mas não será impedido de assumir o cargo que lhe foi confiado pelos eleitores do mais rico Estado do nosso Brasil varonil. Sei que você, meu chapa, em algum momento dessas eleições, brincou com a candidatura do palhaço cearense. Ouso, entretanto, te perguntar: e com os palhaços nos quais você votou, fez alguma piada? E os vários – e bota vários nisso – ladrões profissionais que mais uma vez foram eleitos, o que você fez para desacreditá-los perante a sociedade? Eu, sinceramente, tenho vergonha de criticar Tiririca. Pois não fiz uma corrente – daquelas chatíssimas que se fazem com Power Point e enchem de vírus nossos computadores – contra os marginais, cheradores de pó, traficantes, sonegadores, assassinos, mentirosos e demais desordeiros que concorreram, e foram eleitos, nessa eleição. Que moral eu tenho para entristecer Tiririca?

          Por último eu quero dizer que o responsável pelo circo verde e amarelo chama-se República. É por isso que Deodoro da Fonseca não queria a República no Brasil. Sim, porque o marechal intentava tão somente substituir o gabinete imperial, no fim do século XIX. Ele sabia que, à época nossa pátria não suportaria uma República. Em uma carta que escreveu ao sobrinho que cursava a escola militar no Rio Grande do Sul, em setembro de 1888, Deodoro afirmou: “ República no Brasil é desgraça completa – É a mesma coisa”. Para o marechal, um país carecia de gente educada e dada ao respeito, para fazer uma República funcionar corretamente. O leitor mais atento perguntará: “Mas não foi Deodoro quem proclamou a República?”. Nesse caso, veja como começou nossa República. Salve, Tiririca.

 
PS: A afirmação de Deodoro pode ser encontrada na página 37 do livro Soldados da Pátria - História do Exército Brasileiro 1889-1937 -, do autor Frank D. McCann, publicado em 2007 pela Companhia das Letras.São 700 páginas indispensáveis a quem tem interesse de saber a verdadeira história do Brasil.

segunda-feira, 25 de outubro de 2010

"Eu quero ser bandido"

          Antes de qualquer coisa, informo-lhe, paisano, que a história que vou contar é a mais pura verdade. Passou-se em uma cidade aqui perto de Florianópolis. Mudarei o nome dos personagens para evitar problemas para eles. Aconteceu com um casal que tem um filho de seis anos. Anos, não, aninhos, para ficar mais meigo. Se bem que, de meigo o guri não tem nada. Ou pelo menos não tinha. O sonho do menino era ser bandido. Isso mesmo, bandido, marginal, ladrão ou derivados. E os pais, coitados, preocupadíssimos com os anseios do pequeno. E vou te contar, o piá é o que costumamos chamar de pestinha. E olha que eu entendo dessas praguinhas. Sou capaz de identificar um garoto ruim no meio de uma plantação de alface. Quando lhe perguntavam o que ele queria ser quando crescesse, não pensava duas vezes: "Bandido". Agora vamos combinar, tem gente que não pode ver uma criança que já vai perguntando o que ela vai querer ser. Sinceramente, se eu voltasse a ser criança e um desgraçado de um adulto me fizesse a tal pergunta, eu seria malcriado e devolveria na lata: “ora, se você até hoje não sabe o que quer ser, eu que sou criança vou saber?!” Voltemos ao animalzinho catarinense.

          De tão preocupados os pais passaram a procurar uma forma de mudar a cabeça do, então, futuro delinqüente. Lembraram que tinham um amigo delegado. Estava feita a armação. Em dia combinado, levaram o admirador de Fernandinho Beira Mar à delegacia. Chegando lá, apresentaram o fulaninho ao homem da lei. Este foi duríssimo:

- Então é o senhor que quer ser bandido, não é? – e deu uma porretada com o cassetete na mesa. Falou aos berros. O inocente arregalou os olhinhos e apertou as mãos protetoras dos pais.

- Venha cá que vou mostrar ao senhor o que faço com os bandidos que eu prendo – e arrancou o anjinho da proteção paterna. Levou-lhe às celas lotadas. O calor era intenso, os presos suados e amontoados, como se fossem animais sem dono,não entendiam o que se passava. O cheiro de urina e fezes, próprio de delegacias convertidas em presídio, deixou nosso capetinha de testa franzida. E o delegado arrastava o cassetete pelas grades da detenção. Era um barulho amedrontador. De volta à sala, o homem deu o golpe de misericórdia:

- É isso que faço com bandidos. E fique sabendo, se o senhor virar bandido eu vou te caçar até achar. E não adiantará se esconder. Vou te pegar. Vou trazer você para minha delegacia. – Disse isso e despediu-se dos visitantes.

         À noite o pequeno não dormiu. Disseram-me os pais que ele não sossegou. A toda hora acordavam ouvindo barulho vindo do quarto do menor. Quando levantaram para tomar café, deram de cara com o convertido filho. Ainda com a carinha de preocupado o pupilo desarmou-se:

- Não quero mais ser bandido.- Fingido desentendimento os pais apoiaram a decisão do rapazola. E nunca mais, e já faz mais de seis meses, o menino falou em ser marginal. Tratamento de choque? Sim. Pode deixar traumas? Pode. Cá entre nós, melhor um traumatizado honesto e dentro da lei, do que um “maneiro” marginal.

sexta-feira, 22 de outubro de 2010

O mato do tigre e o campo do gato

          O que comemoramos no dia 22 de outubro? Faço a pergunta porque somos instigados a decorar datas desde os primeiros anos de colégio. Quem descobriu a América? Em que dia? Qual a data que marca o início da primeira guerra mundial? E a da queda da bastilha? Chegavam a me obrigar a saber o dia em que Constantinopla foi tomada pelos turcos! Pode uma coisa dessas? O interessante é que a história do Brasil, a nossa história, ficava em segundo plano. Claro, em segundo, não, em quarto, quinto e sexto. Quer saber se tenho razão? Entre nos portais de história, nos sites de governos e procure saber o que aconteceu no dia 22 de outubro. Se você é catarinense, acesse o site do governo de Santa Catarina. Duvido, com tudo quanto é tipo de D, que você encontre o fato mais marcante na história catarinense ocorrido nessa data.

          Na manhã de 22 de outubro de 1912, no local chamado Banhado Grande, foi aceso o estopim daquela que seria a maior guerra envolvendo o exército brasileiro em nossas terras – a Guerra do Contestado. O Banhado Grande era um povoamento de posseiros onde hoje fica o município de Irani/SC. À época a região era disputada por Paraná e por Santa Catarina. Nunca houve, ressalte-se, um entrevero militar entre os dois Estados. De direito o local pertencia a Santa Catarina. O Paraná não aceitava a decisão da suprema corte e insistia em morder um pedaço do vizinho. Vamos aos fatos.

          José Maria, um curador de ervas e conselheiro espiritual, chegara ao Banhado. Tinha vindo de Taquaruçu. Era um líder religioso. Alguns o chamavam de monge. Devido a uma contenda entre coronéis catarinenses, teve que sair às pressas para os Campos de Palmas – toda a região em que ficava o Banhado Grande estava sob controle do Paraná, e no município de Palmas. Era, na verdade, um território livre. Tinha, entretanto, um dono, o coronel Juca Pimpão, de Palmas. Sem nunca ter colocado os pés por lá, tinha dado um jeito de escriturar tudo em seu nome. O governo do Paraná, protegendo o território e defendendo o interesse do coronel, resolve prender os “catarinenses” intrusos.

          Envia o coronel João Gualberto para o Banhado. A tropa militar era composta por 50 praças e sete oficiais. Confiavam cegamente na metralhadora que levavam. Quando José Maria soube que Gualberto estava chegando, propôs conversar, pois não tinha interesse político nem econômico, estava lá por ter sido expulso de Taquaruçu. Gualberto não deu trela, marchou com seu regimento para amarrar os “desordeiros” e levá-los a Curitiba. Quando o dia clareou deu-se o combate. Morreu Gualberto, Morreu José Maria. A força policial nem chegou a usar a metralhadora, pois essa engasgara. Foi aberto um processo em Palmas, para apurar o combate. É conhecido como o Processo do Irani. Tenho a cópia desse processo digitalizada. Foi feita pelo historiador Paulo Pinheiro Machado e repassada às minha mãos pelo Jornalista catarinense Celso Martins, autor de um magnífico livro sobre o tal combate.

          Ou seja, o Combate do Irani está na origem da Guerra do Contestado. E a data vem e vai, ano após anos, sem ser destacada. Porque será que tentam - e como tentam – esconder a história de luta dos brasileiros? Porque nossos heróis são esquecidos? Será que tem a ver com a formação dos grandes latifúndios? Será que tem a ver com a formação das grandes riquezas? Sugiro, amizade, que adquiras o livro do Celso, O mato do tigre e o campo do gato, e mergulhes no dia 22 de outubro de 1910. Essa, sim uma data que deveríamos ser obrigados a lembrar.

quarta-feira, 20 de outubro de 2010

O internauta e o flamenguista

         O que têm em comum o militante político de internet e o flamenguista fanático do meu prédio? Primeiro: nenhum dos dois tem marido. Segundo: são felizes. Terceiro: são portadores de um solitário neurônio. Gente do céu, plena quarta feira, quase meia noite, ouço gritos alucinantes vindo de uma sacada no edifício onde moro. O sujeito berra como se tivesse ganhado na mega sena, ou como se acabara de encontrar  o homem  ideal. “Mengoo, mengo, mengo”. É um desespero total. Torço, e como torço, para o desgraçado do “mengo” não balançar as redes do adversário, seja lá quem esse for. O rapaz, e pela voz sei que se trata de uma pessoa jovem, não tem marido. Se tivesse já teria perdido o vício de bradar “mengo, mengo, mengo”. Torço para que ele encontre o homem de sua vida na próxima parada da diversidade de Florianópolis. O cara, entretanto é feliz. E a felicidade, nesse caso, é derivada da ignorância. Dane-se o mundo, São Pedro perca a chaves do céu, o importante é que o Flamengo faça gol. Pergunte ao gritador, caso você o conheça, quem proclamou a república e ele dirá, tenho certeza: Pedro Álvares Cabral. É fácil ser feliz quando se é desconhecedor da verdade que nos rodeia. Sabendo disso, fica claro concluir a solidão do neurônio que habita o cérebro do meu vizinho alarmado. Alguma coisa poderia ser pior do que ouvir tantos berros? O pior é que sim.


         Todos os dias ao abrir minha caixa de email, deparo-me com algumas mensagens politiqueiras. “Serra é um filho da P. Dilma é uma P. Serra vai governar para a elite, Dilma vai legalizar a corrupção”. Simpatia, no primeiro turno das eleições, teve as disputas para governador, deputado e senador, e alguns colegas meus trabalharam como assessores de comunicação. Aí eu recebia os emails por uma questão de solidariedade aos jornalistas. Agora, no entanto, a coisa passou dos limites. Tem internauta que não tem marido. Tem um camarada – e não vou dizer o nome para não perder a amizade – que me manda no mínimo três emails por dia. Sinto até saudades do flamenguista doente. Definitivamente o meu amigo não tem marido. E sinto, juro por deus, que os boateiros da rede são felizes. Assim como o flamenguista, são frutos da mais pura e brasiliana ignorância. Eles não sabem a forma de governo do Brasil. Sei disso porque eles costumam falar dos candidatos como se estes fossem candidatos a rei, ou a primeiro ministro. “Serra vai acabar com a menstruação obrigatória, Dilma banirá os votos de pobreza de certas classes sacerdotais”. Que absurdo, paisano. Se você é daqueles que me envia email politiqueiro, pare, por favor. Deixe-me dormir em paz.Tem mensagens que é puro terrorismo. Chega a ser nausenate lê-las. Ora, ora, o sujeito gastar o tempo enviando lixo eletrônico para minha caixa. Vai caçar um marido, boca aberta. Tomara que já passe esse segundo turno. Melhor seria se o “mengo” fosse para a série C do brasileiro. Seria o céu. Se bem que para o céu eu não pretendo viajar agora.

terça-feira, 19 de outubro de 2010

Esperteza não tem idade

         O gurí chegou para o pai e perguntou:
- Pai, o senhor sabe fazer sua assinatura de olhos fechados?
- Claro -, respondeu, todo orgulhoso, o pai.
- Pois então, assine aqui meu boletim de olhos fechados.
          É, gente boa, antes de responder alguma coisa, precisamos, antes de mais nada, saber quem está fazendo a pergunta.

segunda-feira, 18 de outubro de 2010

Avaí na segundona

 “O Avaí, meu caro, é como uma tartaruga de costas em cima de um poste. Ninguém sabe como chegou lá, mas todo mundo sabe que um dia vai cair.” Foi o que me respondeu um repórter colega que está no Oriente Médio. Isso porque recebi um email dele, contando como estava sendo a viagem pela chamada Terra Santa, e respondi informando que o Avaí – time de coração do moço – estava na zona de rebaixamento do campeonato brasileiro. Os avaianos doentes pode ser que não gostem da declaração, mas os adversários, com certeza, adorarão.

sexta-feira, 15 de outubro de 2010

Vai um carteiraço aí?

“Sabe com quem você tá falando?”

          Quem de nós nunca ouviu tal frase? Se não ouviu, conhece, de certeza, alguém que teve o desprazer de escutá-la. A pessoa que pergunta, geralmente, acha-se importante demais para ter que se sujeitar às regras e tratamentos dispensados aos comuns. É o conhecido carteiraço. E por mais antiquado que pareça, continua vivíssimo. Agora tem uma situação que me parece sensacional: o cara implora tua atenção, roga para ser ouvido e você não quer perder tempo com um cidadão que não tem a menor chance de latir um “sabe com quem você ta falando”. É que a gente se acostuma com os títulos, passa a respeitá-los e só dá trela para quem os carrega no peito ou na garganta.

          Certa vez, fim dos anos setenta e início dos oitenta do século passado, um amigo meu estava caminhando pelas quadras da Asa Sul, na minha saudosa Brasília. Digo minha porque além de ser a capital do país onde nasci e moro, abrigou-me por alguns anos. Chamo de saudosa porque só quem morou lá conhece as delícias da vida no planalto central. E mesmo com todos os dejetos humanos que os Estados da Federação para lá enviam, Brasília continua firme e forte, feito palanque no banhado. Voltemos ao meu amigo, voltemos à caminhada.

          Quando passou em determinada quadra, que confesso não lembrar qual, ouviu um tímido chamado. Um rapazola com seus dezesseis anos segurava um violão. E pediu que meu amigo escutasse as canções que fizera. Que as avaliasse. Estava aflito por uma aprovação, mesmo que fosse de um incógnito passante. Meu amigo, apesar de desconhecer o projeto de cantor, foi educado e ficou lá ouvindo algumas músicas. Depois o anônimo perguntou o que Marcelo – esse é o nome do meu amigo – achara das composições. O filho de catarinenses mostrou-se impressionado com a qualidade das canções. E foi embora.

          Anos depois Marcelo foi surpreendido com a presença daquele ex-anônimo, agora famosíssimo, empunhando uma guitarra e cantando a plenos pulmões em horário nobre da televisão. E Marcelo lembrou de imediato a música que ouvira anos antes em um banco qualquer de uma quadra residencial de Brasília: “Tire suas mãos de mim, eu não pertenço a você. Não é me dominando assim, que você vai me entender. Eu posso estar sozinho, mas eu sei muito bem aonde estou. Você pode até duvidar, acho que isso não é amor”. Renato Russo não tinha nome, consequentemente não podia ter obrigado Marcelo a ouvi-lo. Marcelo, por sua vez, teve a honra de assistir a um show particular daquele que se tornaria uma lenda da música brasileira. Estamos preparados para escutar quem não tem carteira para nos mostrar?

quinta-feira, 14 de outubro de 2010

Um calção velho, uma manga e uma vida besta

          “Um velho calção de banho”, cantou o poeta. Nada muito complicado. Coisa baratíssima. Pode ser o suficiente para alegrar o bendito possuidor. Não é preciso um iate de luxo. Muito menos um jatinho. Uma roupa desbotada pode ser mais do que perfeita para deixar feliz quem a usa. A felicidade é um alvo no qual miramos diuturnamente. O interessante é que as caras “amarradas” se multiplicam ao nosso redor. Será que atiramos tão mal? Qualquer “todavia” é motivo de separação entre casais. Um simples e educativo “não” é mais do que suficiente para um terneiro mamão se achar no direito de não falar com a mãe. Ou com o pai, se o bovino for presente. Queremos mais, queremos mais, queremos mais. A lógica consumista invadiu lares, do mais pobre ao abastado. Um bebê chorão de dez anos não suporta o peso de viver sem uma internet velocíssima. E pensar que eu brincava de ser fazendeiro – e lá se vão algumas décadas, Jesus Cristo! – espetando palitos em pequenas mangas e transformando as frutas em nelores, zebus e charolêses. Os palitos eram os pés dos quadrúpedes. Ah, cheguei a abastecer os maiores frigoríficos da América latina. Enricava enquanto trajava um legítimo calção vagabundo, verde com umas listras brancas. Debaixo da árvore eu comprei uma motocicleta, um opala e um sítio com gado de verdade.

         O tempo vai passando e nossos sonhos vão se concretizando. Um e outro se perdem na estrada do destino. As velhas mangas agora são milhões de reais a serem perseguidos. E as conquistas não trazem sorrisos descomprometidos. Carregam a insônia, a preocupação e os remédios. E me pergunto se aquela “vida besta, meu Deus”, da qual falou Drummond, era mesmo besta. Pensando nisso, eu comprei um jogo de dardos. Sempre quis ter um. Não é um brinquedo caro. Não me pergunte o motivo de não tê-lo adquirido antes. Talvez os bens mais caros tragam mais status. Mesmo sem perceber, somos engolidos pelo capitalismo de fachada. A verdade é que passamos o fim de semana espetando o piso de madeira, a parede e, às vezes, o alvo. Verdade é que depois de algumas horas já dominávamos a arte de lançar as pequenas setas de aço. E fiquei pensando no velho calção de banho, nas mangas e na vida besta.

Diversão barata para o fim de semana