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segunda-feira, 15 de março de 2010

Desculpa aí

         Quando pequeno ouvi uma pessoa, irritada, dizer: “Depois que inventaram desculpa, nunca mais alguém perdeu os dentes”. Apesar da tenra idade, à época, refleti sobre o que escutara e guardo até hoje a assertiva. Uma vez, jogando futebol, um colega falou um monte de bobagens que eram perfeitamente desnecessárias. Vale salientar que as bobagens nem sempre são supérfluas; às vezes são totalmente oportunas. Depois que o zangado percebeu o erro cometido, dirigiu-se a mim e, estendendo a mão, ordenou-me: “Desculpe”. Eu fiquei quieto, pois entendi que ele estava dando uma ordem, quando a situação exigia, da parte dele, um pedido. O cidadão notou que a entonação que usara não era das mais propícias e consertou: “Eu estou pedindo, desculpa”. Aí sim, estirei o braço e apertei-lhe a mão concedendo desculpa. Mas nem sempre as coisas são assim.
          

         Ora, ora, um sujeito falar umas besteiras, arrepender-se e se desculpar é algo aceitável. O mesmo não pode, ou não deve, se dizer à cerca de um crime. Venhamos e convenhamos, será um caos se todo mundo entender que pode matar um ser humano e depois pedir desculpas aos parentes, crendo que a vida seguirá ao natural. Imagine um estuprador que, ao ser preso, dirige-se ao pai, ou esposo, da vítima e diz: “Desculpa aí”. Se você fosse o pai, ou o esposo, desculparia e solicitaria que ele fosse solto? Agora eu tenho certeza que, se alguém no meio de uma multidão, pisa no teu pé e pede desculpas, você concede. A dimensão do delito é quem vai dizer se cabe um simples pedido de desculpas ou se é preciso algo mais forte.

          Na semana que passou o chefe dos bispos alemães, Robert Zollitsch, pediu perdão às vitimas de abusos sexuais cometidos por padres em seu país. Como é simples! Um pedido de desculpas tíbio, forçado pelos fatos e travestido de cristão. Digo, travestido, devido a palavra usada pelo presbítero: perdão. Exatamente, alguns seguidores do cristianismo costumam trocar  desculpa, por perdão, achando que essa alteração torna o pedido em algo bíblico. E como ficam os pais das crianças? E como ficam as próprias crianças? Para ter respostas basta entender como é que o Vaticano enxerga a pedofilia no seio de sua cúpula.

          A Congregação para a Doutrina da Fé é quem cuida de assuntos ligados aos crimes de abusos sexuais cometidos por padres católicos. O promotor de justiça dessa congregação, Charles J. Scicluna, abriu o coração sobre o que pensa a respeito dessas barbaridades: "Os casos de sacerdotes acusados de pedofilia são uns 3.000 em nove anos dos mais de 400.000 sacerdotes diocesanos e religiosos que há em todo o mundo”. Ou seja, conforme Scicluna, 3.000 pedófilos é um número quase irrisório. Além disso ele deixou as vítimas em segundo plano - o importante, pelo visto, era defender a empresa. Conclusão: para a santa igreja, um pedido de desculpas é até muita coisa. E então, depois que inventaram a desculpa...

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