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quarta-feira, 27 de abril de 2011

Divina indignação

     Outra vez, Jipão agrediu Bibigul. Covardemente, diga-se de passagem. O leitor contumaz desse blog sabe que Jipão é o nome de uma terneira Jersey, e Bibigul é uma bezerrinha mestiça de Holandesa, bem mais nova do que a agressora. A holandesinha leva esse nome porque é glutona, como é a personagem homônima na obra O Livreiro de Cabul. Jipão não tolera a presença de Bibigul. Na hora da ração, nem se fala. É preciso que o tratador, no caso eu, fique entre as duas. Caso contrário, Bibigul terá que se contentar com o pasto, enquanto Jipão se refestela no trato especial. É uma violência imbecil, como toda violência. E covarde, como já disse na segunda frase deste parágrafo. Digo isso porque todo ato violento parte de um agente mais forte para uma vítima mais fraca – isso é uma tremenda deslealdade. A destruição da cultura indígena, por exemplo, é um típico caso de covardia perpetrada por brancos metidos a filhos de Deus. Tanto no Brasil, como nos Estados Unidos, os conquistadores europeus chegaram municiados de bíblias, sacerdotes e armas de fogo. O índio não tinha outro recurso: ou aceitava a escravidão, entregava suas terras e se convertia a nova religião, ou era assassinado. O mesmo ocorreu com os negros, com os judeus na campanha nazista e com as minorias em todo o mundo. A violência é um ato covarde. E insano, também.

     Daqui a alguns meses, Bibigul terá o dobro do tamanho da Jipão. Sim, a raça Holandesa é de grande porte, já a Jersey é nanica. Em breve, se as coisas continuarem nessa batida, a guerra vai ser inevitável. A guerra, meu chapa, é fruto da violência. A violência é insana, e a guerra é a insanidade materializada em toda sua plenitude. Um sujeito vê-se de frente a outro que nunca viu, não sabe o nome, onde mora, ou quem são seus familiares. Mesmo assim, puxa o gatilho e estoura-lhe os miolos. É insano. Agora, imagine uma guerra em que um lado dos combatentes tem mísseis enquanto o outro só dispõe de pedras. É muita covardia. Tudo isso para que? Para ser o dominador. Para ter o direito de mandar prender, soltar ou matar quem bem entenda. Aos de pedras na mão, resta tentar sobreviver, trocar os seixos por metralhadoras e contra-atacar. Como Bibigul está fazendo.
 
     E quando a covardia acontece pertinho de nós, dentro das empresas em que trabalhamos, nas salas de aulas em que estudamos ou no condomínio em que vivemos? Não fiquemos “sentados no trono de um apartamento com a boca escancarada e cheia de dentes esperando a morte chegar,”como cantou Raul Seixas. Você ainda tem a capacidade divina de se indignar. E essa indignação, paisano, é a chave de qualquer mudança.

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