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quinta-feira, 24 de novembro de 2011

Neymar, o cai-cai


     “Neymar é um cai-cai”, diz aquele cérebro de mosquito que pensa ser um ás no conhecimento do esporte bretão. “O cara não pode encostar nele que ele se joga”, completa uma minhoca travestida de humano que tem na televisão sua única fonte de conhecimento. “Tem é que levar porrada mesmo pra aprender o que é falta”, espuma um filhote de chipanzé que nunca, nunca, deveria ter perdido o rabo e descido das árvores. “Se eu fosse o árbitro, expulsaria esse magricela por simulação”, exclama o candidato a político, exímio em distorcer a verdade a ponto de acreditar nas próprias mentiras. Meus amigos, só mesmo quem não tem a menor intimidade com a gordinha empurrada mais de mil vezes por Pelé para as redes pode pensar assim. Somente quem nunca viu um craque com a perna quebrada por um descendente de gorila é capaz de culpar o ídolo santista pelas quedas no gramado. Só quem nunca levou uma bordoada de um marcador sedento de sangue pode ficar irritado com os pulinhos – digamos assim – do sucessor de Edson Arantes do Nascimento na equipe da baixada. Quando escuto essas asneiras – com todo respeito aos milhares de jegues que andam soltos pelas rodovias nordestinas – sinto ânsias de vômito. Neymar cai? Cai. Sem trocadilhos, por favor. Ele é acrobático quando sente os cravos da chuteira do monstro que vem assassiná-lo? Lógico que é. Ou achas, paisano, que a habilidade personificada deveria ficar paradinha esperando ser alvejado? Acreditas mesmo que o bom jogador tem que se comportar como uma ovelha levada ao matadouro? Acreditas na justiça, companheiro? Há justiça se uma das partes envolvida numa querela não pode se defender? Esse é o caroço da questão.

     Se não fosse a destreza em saltar, Neymar já estaria com pinos nos dois joelhos. Quando pula, o atleta defende-se de algozes que fazem da pancada sua arma. As armas de quem sabe jogar bola são os dribles e a capacidade de esquivar-se de minotauros fantasiados de boleiros. Saltar é preciso, meu chapa. Ao pular, a vítima deixa o corpo leve. E um corpo leve – como bem evidencia o tcheco Milan Kundera em “a insustentável leveza do ser” – é um corpo protegido. O ar é parceiro, padroeiro e cúmplice do craque na arte que consagrou Garrincha. Ao sentir que será alvejado, Neimar recorre ao ar como um soldado à casamata. Passada a fúria animalesca do inimigo, o santista arranca para o ataque e só para quando vê a rede adversária gritando “chuá”. E mais uma vez ele salta. O salto da vitória. Um abraço fraterno no ar. Um soco no ar. Um grito no ar. O torcedor se diviniza e grito gol. E o ar mais uma vez entra em cena para levar aquele som adiante. O mastodonte, incapaz de destruir o craque... queda-se. Acusa o golpe. Rosto taciturno, dentes cerrados, moral lá embaixo. Feito uma carreta com o motor batido, arrasta-se em campo. Não é notado. Nem os seus olham para ele. A beleza e a arte futebolística vencem a crueldade e a truculência do pseudo futebol força. Vai, Neymar, pula. Salta, sim, caso seja preciso. Vai, você leitor que gosta do bom futebol, e comemora um salto de um artista que está sendo caçado em campo. Esquece esse papo furado de cai-cai. Tens mais do que um neurônio, sei disso. Então não reproduza o discurso de quem não sabe jogar futebol. De quem só conhece a violência como maneira de vencer. Veja, note o ar como atacante. Ele está em campo a favor do espetáculo.

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