Utilização do conteúdo

Autorizo o uso do material aqui produzido, desde que seja dado crédito ao autor e não tenha uso comercial

quarta-feira, 12 de janeiro de 2011

Seria o mundo um grande curral?

     Gerineldo ganhou um cincerro. E pelo visto nao gostou do adereço. Talvez aquele “telengo-tengo” que ele escuta, toda vez que mexe o pescoço, seja, realmente desconfortável. Ora, o tourinho nunca tinha visto algo parecido. De repente o adorno barulhento lhe foi imposto. Quem o colocou? O dono, certamente. É aquela mania que as pessoas têm de comandar quem é mais fraco do que elas. E os bois, colegas, apesar da força, são débeis na inteligência. Não fosse assim, o mundo seria um grande curral. Há quem diga que não seja muito diferente, mas vamos deixar isso por conta de cada mente. Os demais companheiros estranharam o ornamento. Ficaram alguns minutos arrodeando o colega, examinando, ao que pareceu, a novidade. Depois, como se faz com tudo que é moderno, recente e desconhecido, deixaram de lado e foram fazer o que mais lhes apraz: pastar. Gerineldo, entretanto, resolveu empenhar-se na missão 2011: tirar o chocalho do pescoço. A tarefa não é das mais fáceis. Vez por outra, ele esfrega o barulhento em uma árvore. Até agora, nada.

     Quando o tratador se aproxima do estábulo, é uma algazarra. Gerineldo se esquece da percussão que carrega e dispara em direção à ração. O olfato, meus caros, é, nos bovinos, assim como nos humanos, o sentido mais sensível. Principalmente quando comandado pelas reclamações das tripas. A fome tolhe o raciocínio dos quadrúpedes. Nada diferente do que acontece com os filhos de Adão. O terneiro, obcecado em satisfazer o desejo da barriga, preocupa-se apenas em se afofar na ração. É de boa paz, o chifrudo. Esse de quem estou contando. Não me refiro a todos os guampudos que conheço, que, convenhamos, não são poucos. E, por ser assim, não dá cabeçada em Bibigul – uma bezerrinha de seis meses que insiste em andar perto dele. Gerineldo não é o tipo que desconta nos outros o sofrimento que lhe caiu nos lombos. Mesmo tomando, vez em quando, umas bordoadas do Pirata - o manda-chuva do pedaço -, não se aproveita de quem é, por natureza, mais fraco do que ele. Ele parece entender que Bibigul não tem culpa no cartório. Por isso não descarrega-lhe o recalque.

     Depois de encher a pança, a porteira é aberta e ele livra-se da opressão do curral. Sua natureza exige liberdade. Não pode, por mais que o estomago peça, limitar-se ao redil. Bibigul o acompanha; Jipão também. Os três são adolescentes. O chocalho, agora, parece não incomodar. O intestino forrado é capaz de proezas que até Deus duvida.






Nenhum comentário:

Postar um comentário