Pense numa combinação para dar errado: igreja evangélica e buteco. O Word, esse ignorante, já me corrigiu. Assinalou com um vermelho a palavra buteco. Ele exige, como se meu editor fosse, que eu escreva boteco. Não farei, entretanto, tal coisa. Isso porque, boteco e buteco não são, nem de longe, a mesma coisa. Buteco tem a cara do povo. Lembra bebum. Lembra cachaça. Lembra, também, futricas. Para muitos, é o caso do meu amigo Crasbonaldo, lembra confusão. Para ele, quase todo rolo tem início na ingestão de álcool. Um professor que tive na faculdade de Administração, bebaço bem resolvido, com se dizia, costumava recitar, ironicamente, sua litania de sexta à noite: “A bebida degrada a alma e corrompe o homem”. Um belo dia, passeando por Roma, teve um mal súbito e se foi. Os alunos receberam a nota de falecimento com pesar. “Problemas de coração”, informava a universidade. No corredor, o zum-zum-zum revelava outra versão: “Foi a marvada, a manguaça, a branquinha”. Se foi o músculo cardíaco ou o fígado quem pifou, não sei até hoje. Sei que o intelectual – pois ele era um desses – morreu bem próximo ao Coliseu. “Morreu bem”, brincou um aluno menos sensível. Mentes mais maliciosas e cheias de picardia acreditam piamente que buteco tem grande afinidade com sexo. As mulheres, principalmente elas, pensam assim. Diga, o coitado do marido, que vai ao buteco... “Vai atrás de (...), não é? Pois então, amizade, imagine um boteco e uma igreja divididos por uma única e miserável parede. Daquelas construídas com tijolos de oito furos, que são tão eficientes em evitar a propagação do som tanto quanto um balaio é próprio para ser usado como depósito de gasolina. Já o boteco é coisa de grã fino e não merece espaço nessa crônica. Fica para outro dia.
Igreja Evangélica Assembléia de Deus. Cultos às terças, quintas e domingos; sempre às 19h. Escola dominical no domingo às 9h. Some-se a essa bagatela as reuniões de jovens, de senhoras, os ensaios da mocidade e outros ajuntamentos necessários ao bom andamento da instituição e o resultado será um templo aberto quase sempre. Numa igreja pentecostal, as reuniões são, via de regra, entusiasmadas. A música é no dez. Os sermões, para que ninguém durma e para que tenham maior credibilidade por parte dos presentes, são feitos por preletores cujas carótidas parecem prestes a explodir. Fora do prédio, o movimento fica por conta de jovens namorados que aproveitam o descuido dos pais para trocarem beijos inocentes. Ah, candidatos a namorados também ficam do lado de fora buscando um coraçãozinho desocupado. O problema, paisano, é quando, do lado de fora, um sujeito “mais pra lá do que pra cá”, grita: “Bota uma dose aí pra mim, ô”. Que barbaridade, Gilead, você pode estar pensando. Calma, paisano, pois esse quadro pode ser visto aqui em Florianópolis.
Para quem chega ao trevo de Jurerê internacional e da Daniela, no Norte da Ilha, basta olhar à direita. Igreja e buteco irmanam-se por uma parede. Os religiosos chegaram primeiro, sou testemunha. Não foram capazes, por que eu não sei, de impedir que a concorrência se instalasse. Se bem que, como dizia um evangélico das antigas, “material de fazer crente é o descrente”. Será, penso agora, que o pastor deixou os bebuns se achegarem para pescá-los posteriormente? Não, seria muito arriscado. Quando tem jogo de futebol, então! Louvores a Deus e gritos de gol se confundem. Creio mesmo que quem sai ganhando nesse negócio são os da cachaça.
– Pra onde você vai, mal-acabado? – pergunta a dona encrenca.
– Vou pra igreja, querida –, responde o maridão.
– De bermuda e camiseta? – desconfia a mulher.
– É a modernidade, meu amor – improvisa o homem, certo de que, caso a esposa vá atrás dele mais tarde, basta livrar-se do flagrante, o copo, e dar um passo para o lado. Apenas um passo será suficiente para levá-lo do bar à igreja.
Curioso como sou, dia desses vou parar para conversar com o pastor e com o dono do bar. O que danado eles fizeram para conviver pacificamente? Com a fórmula na mão, ficarei milionário. Poderei unir norte-americanos e mulçumanos, noras e sogras, pais e filhos e por aí vai. Igreja e buteco, é brincadeira?