Como dizem os serranos: “Se foi, o cascão”. E pronunciam o “se” como tendo um circunflexo sobre o e. Cascão, gordo, gorducho, dentuço, Ronaldo... Nome ou apelido jamais caiu-lhe tão bem quanto o mais famoso de todos – Fenômeno. Quem viu, como eu, o magricelinha jogador do Cruzeiro aprontando suas peripécias enquanto bordava os gramados no seu primeiro campeonato brasileiro, sabia que aquele menino não era só cheio de dentes que mal cabiam na boca. Era um pré-sal futebolístico. Uma certeza de lucros astronômicos para quem nele investisse. E foi o que fizeram os europeus. Levaram nossa jazida – sim, nossa; hoje todo brasileiro sabe que Ronaldo é do Brasil – por uma quinquilharia. Mesmo assim, burilaram o guri e ele veio a ser o maior artilheiro das copas do mundo.
Há quem diga que a crônica feita por um fã fica sempre sub judice. Ora, dane-se quem pensa assim. Não é porque admiro – é seria um parvo se pensasse diferente – o gordo que vou deixar de escrever sobre ele. Conversando com um colega ontem à noite, ele me espetou: “Não faça a crônica, o texto ficará muito imparcial”. Fala sério, jacaré, desde quando o jornalismo é imparcial? Desde quando o ser humano é imparcial? A imparcialidade é um mito usado por quem quer esconder suas preferências. Você, nobre leitor, tem irmãos, primos, tios, pais, colegas ou coisas do gênero? E entre teus irmãos não preferes um determinado? E entre teus primos não gostas mais da companhia de um em detrimento da de outro? Quando se gosta, paisano, quando se tem preferência, nossos julgamentos passam pelo crivo do coração. E o coração, simpatia, jamais será imparcial. É por isso que muitas vezes ficamos indignados quando vemos a mãe de um criminoso defendendo o rebento. Não aceitamos tamanho absurdo. Coisas do coração, meu caro. Só entendemos quando caímos na mesma trincheira da mãe do transgressor. Voltemos ao cascão.
Ele jogaria no meu time mesmo com trezentos quilos. Ou os senhores acham que algum time do futebol brasileiro tem um centroavante com a qualidade dele? Jogando pelo São Paulo ele faria – de tanta assistência de Dagoberto -, no mínimo, três gols por jogo. E bastaria jogar, como ontem, quinze minutos. É uma pena o futebol ser tão retrógrado. Tivesse no comando da FIFA pessoas mais evoluídas na arte de administrar, e o esporte bretão seria como o basquete ou o vôlei. O atleta poderia entrar e sair da partida por vezes indeterminadas. Aí o Brasil não teria perdido o Fenômeno tão cedo. Já pensou, cidadão, se o Santos contasse com os preciosos serviços do dentuço? Já poderia considerar-se campeão da Libertadores. O futebol, entretanto, insiste em viver na era das cavernas. Seus dirigentes, atolados em denúncias, estão mais preocupados em salvar a pele e garantir uma polpuda conta bancária. E nós, reles mortais, temos que ficar órfãos de craques. Adeus, Ronaldo, o futebol te deu a glória, o futebol tirou-a. Continuarás, mesmo assim, durante os próximos 45 séculos, sendo o eterno Fenômeno. E quando tiver um campeonato aqui na AABB de Floripa, vou te ligar para seres o goleador do meu time.
Pré-sal futebolístico foi muito bom. Mas ontem ele jogou 15 minutos e perdeu três gols. Já estava na hora dele parar.
ResponderExcluirFantástica esse negócio de Pré-sal futebolístico. Mas aqui no Paraná, estamos apostando que o Curitiba tem enormes jazidas.
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