- Fala com aquele menino dentuço; ele sabe o que houve.
- Mas o narigudo também presenciou a briga; ele viu quem começou.
- Então pergunte para a professora, aquela do cabelo grisalho.
Casos da infância, que não voltam mais. Ótimo, saber que não voltarei a ser um menino sambudo. Péssimo saber que os casos também não darão mais o ar da graça. Talvez, pra ser sincero, ainda retorne em algum colégio de pequenas cidades interioranas. Mas serão tão raros que, provavelmente, serão transformados em espetáculos de programas sensacionalistas. Calma, simpatia, não me refiro a arengas entre crianças no pátio da escola; isso não acabará nunca. Muito menos a professoras amadurecidas pelo tempo; sempre haverá uma ou outra tiazona. Também não me reporto à mania que alguns pirralhos têm de apelidar os colegas. Oxalá fosse. Mas não é.
Trago à baila o “dentuço”, o “narigudo” e o “cabelo grisalho”. Coisas que não voltam mais. E quando insistem em sair das trevas em que foram lançados, são extirpados pela sociedade moderna. Por mim, por você e por nossos contemporâneos. É, Jacundá. Vais me dizer que não conheces, pelo menos, quatro pessoas na tua família que usam aparelho na boca? E teus amigos? Quantos deles exibem elitistamente um sorriso metalizado? Vários, hem? E então, gente boa, nunca te questionastes sobre a quantidade de crianças ancabrestando os mordedores? Espera aí, não me tome por ignorante. Só se eu fosse uma besta quadrada para não saber que certos casos são de ordem médica – a estes faço reverências. Entretanto eu fui ao dentista, um dia desses, e a becada queria me empurrar um sorriso robótico. Perguntei-lhe sobre o benefício que aquilo me traria. “É uma questão de estética, Gilead”, orientou-me. “Se é por isso, tá dispensado”, retruquei.
Onde já se viu, meu Deus do céu, não tive um dente sequer arrancado da minha arcada dentária. Agora querem extrair meu sorriso? Exatamente, coroa. Se há, que eu não acredito, imperfeição nos meus mastigadores, é exatamente isso que me auxilia na tarefa de ser impar. Não quero uma dentição de série, fruto de uma linha de montagem que torna todos os sorrisos prateados. Depois do aparelho ortodôntico vem um riso igual ao do colega, que é igual ao do rico, que é igual ao do artista. Kanban. Contudo, se a pessoa acha que ficou bonita! Vai assinar o pay-per-view do Big-brother, inteligente. Menino dentuço? Coisa do tempo em que bumba-meu-boi ainda era bezerro. Aí chega um terneiro-mamão e - por increça que parível – exige que os pais lhe paguem o fetiche bucal. Tá sobrando dinheiro no bolso do brasileiro, como alardeia o Governo. Imagine, vivente, uma partida de futebol onde os dois zagueiros, eu e meu amigo Gonzalo – que juntos somam quase um século -, usam aparelho. Coisa linda!
Tendo em vista que entrei nesta seara, não posso esquecer o narigudo. É outro dinossauro. Não, ainda não. Mas está com os dias contados. A rinoplastia é a cirurgia plástica que mais cresce no mundo. Em certas clínicas o sujeito paga míseros dois mil reais e sai com o nariz de Brad Pitt. Verdade, o cara chega a escolher o astro de quem vai imitar o nariz. De certa forma vai poder dizer de peito aberto: “Sou dono do meu nariz”, mais do que nunca. Vale tudo em nome da beleza, diria o cara cujo neurônio morreu de solidão. Deixa estar, ladrão de oxigênio, em breve estarás fossilizado.
E a professora de cabelo grisalho? Acorda, criatura! Ela mudou. As cãs deixavam-na diferente das mais novas. Agora ela mete um balde de tinta amarela na cabeça e vira uma Merlyn Monroe. Igual a trocentas outras Merlyns espalhadas pelas centenas de escolas. O dentuço, o narigudo e cabelo grisalho são como a rosa que desabrochou e não voltará, jamais, a ser botão. Ah, passado, quem te matou? Ah, presente, quem te matou? Ah, futuro, quem te matou?
- Mas o narigudo também presenciou a briga; ele viu quem começou.
- Então pergunte para a professora, aquela do cabelo grisalho.
Casos da infância, que não voltam mais. Ótimo, saber que não voltarei a ser um menino sambudo. Péssimo saber que os casos também não darão mais o ar da graça. Talvez, pra ser sincero, ainda retorne em algum colégio de pequenas cidades interioranas. Mas serão tão raros que, provavelmente, serão transformados em espetáculos de programas sensacionalistas. Calma, simpatia, não me refiro a arengas entre crianças no pátio da escola; isso não acabará nunca. Muito menos a professoras amadurecidas pelo tempo; sempre haverá uma ou outra tiazona. Também não me reporto à mania que alguns pirralhos têm de apelidar os colegas. Oxalá fosse. Mas não é.
Trago à baila o “dentuço”, o “narigudo” e o “cabelo grisalho”. Coisas que não voltam mais. E quando insistem em sair das trevas em que foram lançados, são extirpados pela sociedade moderna. Por mim, por você e por nossos contemporâneos. É, Jacundá. Vais me dizer que não conheces, pelo menos, quatro pessoas na tua família que usam aparelho na boca? E teus amigos? Quantos deles exibem elitistamente um sorriso metalizado? Vários, hem? E então, gente boa, nunca te questionastes sobre a quantidade de crianças ancabrestando os mordedores? Espera aí, não me tome por ignorante. Só se eu fosse uma besta quadrada para não saber que certos casos são de ordem médica – a estes faço reverências. Entretanto eu fui ao dentista, um dia desses, e a becada queria me empurrar um sorriso robótico. Perguntei-lhe sobre o benefício que aquilo me traria. “É uma questão de estética, Gilead”, orientou-me. “Se é por isso, tá dispensado”, retruquei.
Onde já se viu, meu Deus do céu, não tive um dente sequer arrancado da minha arcada dentária. Agora querem extrair meu sorriso? Exatamente, coroa. Se há, que eu não acredito, imperfeição nos meus mastigadores, é exatamente isso que me auxilia na tarefa de ser impar. Não quero uma dentição de série, fruto de uma linha de montagem que torna todos os sorrisos prateados. Depois do aparelho ortodôntico vem um riso igual ao do colega, que é igual ao do rico, que é igual ao do artista. Kanban. Contudo, se a pessoa acha que ficou bonita! Vai assinar o pay-per-view do Big-brother, inteligente. Menino dentuço? Coisa do tempo em que bumba-meu-boi ainda era bezerro. Aí chega um terneiro-mamão e - por increça que parível – exige que os pais lhe paguem o fetiche bucal. Tá sobrando dinheiro no bolso do brasileiro, como alardeia o Governo. Imagine, vivente, uma partida de futebol onde os dois zagueiros, eu e meu amigo Gonzalo – que juntos somam quase um século -, usam aparelho. Coisa linda!
Tendo em vista que entrei nesta seara, não posso esquecer o narigudo. É outro dinossauro. Não, ainda não. Mas está com os dias contados. A rinoplastia é a cirurgia plástica que mais cresce no mundo. Em certas clínicas o sujeito paga míseros dois mil reais e sai com o nariz de Brad Pitt. Verdade, o cara chega a escolher o astro de quem vai imitar o nariz. De certa forma vai poder dizer de peito aberto: “Sou dono do meu nariz”, mais do que nunca. Vale tudo em nome da beleza, diria o cara cujo neurônio morreu de solidão. Deixa estar, ladrão de oxigênio, em breve estarás fossilizado.
E a professora de cabelo grisalho? Acorda, criatura! Ela mudou. As cãs deixavam-na diferente das mais novas. Agora ela mete um balde de tinta amarela na cabeça e vira uma Merlyn Monroe. Igual a trocentas outras Merlyns espalhadas pelas centenas de escolas. O dentuço, o narigudo e cabelo grisalho são como a rosa que desabrochou e não voltará, jamais, a ser botão. Ah, passado, quem te matou? Ah, presente, quem te matou? Ah, futuro, quem te matou?
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