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terça-feira, 3 de agosto de 2010

Eu não sou cachorro, não

          Diz-me uma coisa: você já ouviu falar no general Setembrino de Carvalho? Não? Se você é natural de Santa Catarina, coloque um ponto de exclamação depois do sinal de interrogação. Se você se considera uma pessoa de farto conhecimento, também coloque o símbolo exclamativo. Caso mores no estado onde nasceu Gustavo Kuerten, embora tenhas vindo de outras paragens, como é o meu caso, perdoar-te-ei o desconhecimento. O famoso militar foi o comandante da mais importante expedição do exército enviada ao Contestado. Lembra da Guerra do Contestado? Pois bem, quando o General chegou no palco do conflito, pelas bandas de Caçador, Curitibanos, Lebon Regis e outras povoações, ficou impressionado com o desnível social reinante.

          E no relatório que fez, escreveu assim: “A diferença de condição entre o proprietário e o camarada era e é de tal sorte manifesta que suas relações em muito se assemelham às que deveriam existir entre escravos e senhor” (Setembrino de Carvalho, 1916:2). Ou seja, lá se vão 100 anos de história. Os tempos, entretanto, mudaram. A sociedade evoluiu. Os pobres já não são assim tão miseráveis. Os religiosos ultrapassaram o fundamentalismo e os políticos deixaram para trás a corrupção. Hoje cedo assisti a uma reportagem envolvendo alguns jogadores de futebol do Santos. Os atletas estavam na concentração e resolveram entrar na internet. Quando um torcedor, que interagia com eles, criticou o goleiro – chamando-o de mão de alface -, este deu uma resposta que me lembrou Setembrino: "Aí, fera, o que eu gasto com o meu cachorro de ração é o teu salário por mês", fulminou.
 
          Gente do céu, aonde vamos chegar! O torcedor foi colocado em uma situação de total desprezo. A desigualdade financeira coloca atletas de futebol e a maior parcela da população brasileira em patamares diferentes. Os ricos se acham no direito de humilhar, de pisar e tripudiar o menos favorecido. O que achas, paisano, que o General Setembrino diria ao ouvir tal besteira dita pelo futebolista? Para ser sincero, eu não sei. Mas sei que o filósofo Waldick Soriano cantaria assim: “Eu não sou cachorro, não, pra viver tão humilhado. Eu não sou cachorro, não, para ser tão desprezado”. Pois é.

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