É incrível como tem gente incompreensível. Agenor, chamemos assim o meu amigo. Sócrates, não aquele desajeitado bom de bola que jogou no time brasileiro perdedor da copa de 1982, é meu outro camarada que vou futricar nessa crônica. Agenor e Sócrates, dois compadres com a amizade arranhada pela intolerância desse último. Os nomes são fictícios, amizade. Os fatos, não; são reais. Pois bem, Sócrates mora em uma cidade do interior e Agenor vive nababescamente na Capital. Sócrates vem melhorando muito sua situação econômica. Há alguns anos, vivia de cultivar a terra. Hoje, tem uma fabriqueta, distribui alimento para o comércio do município em que mora e tem até segurança particular. Nada disso, entretanto, se compara a opulência de Agenor. Formado na melhor faculdade da região, herdeiro de uma fortuna e proprietário de empresas de segurança, é um lorde.
De vez em quando, os parentes de Sócrates vêm à capital e hospedam-se na casa de Agenor. Outro dia, Agenor recebeu funcionários do colega interiorano em seu amplo escritório na orla marítima. Na semana passada Agenor precisou visitar Sócrates. Era uma visita interesseira, daquelas que o candidato a prefeito faz ao eleitor. Agenor queria ampliar seus tentáculos pelo interior. E Sócrates preparou-se todo para recebê-lo. Chamou seus melhores homens e encarregou-lhes de proteger o distinto visitante. Preparou-lhes os melhores aposentos e contratou os melhores palhaços para diverti-lo. Agenor chegou em avião particular. Trazia a mulher, duas filhas e a sogra, além de alguns amigos. Ah, vinha com veículo próprio, bem mais seguro e confortável do que o de Sócrates.
Sócrates, sujeito simples, ficou triste com o descaso de Agenor. “Ora, onde já se viu, trazer seguranças particulares. Como se os meus fossem incapazes de protegê-lo”, lamentou. A família de Sócrates, coitada, interiorana e achando que tudo proveniente da capital é para lá de bom, embasbacava-se ouvindo Agenor falar. Podia ser uma idiotice, batiam palmas. Sócrates viu seus seguranças serem desprezados, seu veículo ser preterido e suas acomodações minimizadas. Dois dias depois, na hora de Agenor ir embora, o lugarejo ficou triste. Agenor deixaria saudade. “Ele sorriu para mim”, disse um menino de dentes estragados. “Ele apertou minha mão”, entusiasmou-se um homem que deve R$ 25.000,00 ao banco. Sócrates, sentindo-se humilhado com a prepotência dissimulada do amigo, despediu-se com um frio aperto de mão. Foi para casa, tomou um banho e ligou a televisão. Era hora de acompanhar a visita de Obama ao Brasil.
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